Então é Natal. Estes versos cantados durante muitos anos por Simone sempre vieram nos trazer uma cerca de questionamentos completamente desnecessários para essa época do ano. O que deveria ser um tempo de regozijo e contemplação mundana acabam por se transformar em uma série de cobranças involuntárias por todos os fracassos inevitáveis que foram acumulados ao longo do ano. Todos nós sabemos que não deveria ser assim, mas infelizmente este pensamento não é compartilhado por todas as lojas de natal que insistem em, ano após ano, jogar nas nossas caras moribundas que nós não fizemos nada, fomos apenas vagalumes penando pelo vale da escuridão com um lâmpada introduzida em lugar jocoso e tentando encontrar algum sentido para a inexorável passagem do tempo que apenas nos aproxima da morte.
Simone, todos nós sabemos, ou pelo menos deveríamos saber, é mais uma soldada do capital maroto, uma agente infiltrada do porcelanato patrimonialista que abrange todos os feixes de luz e nos impedem de saborear um maldito peru. Ave está que, infelizmente, nos obriga a pensar sempre em um trocadilho de cunho sexual, fruto do patriarcado em que estamos envolvidos desde o nascimento. Afirme que alguém foi levar um peru para casa. Que alguém abocanhou um peru. Que alguém está com a boca cheia de peru. O peru assado. Tudo o que vem nas nossas pobres mentes lacanianas é a imagem de um volumoso órgão sexual masculino pulsando e sendo mordido, lambido, esfregado e invariavelmente ferido nesta saga natalina.
O natal é, pois bem, época de acúmulo e desperdício. Duas palavras separadas por 47 páginas no meu mini dicionário da língua portuguesa, conta que repeti mecanicamente por diversas vezes, afinal a vida sem método é apenas uma barafunda abstêmia abastecendo os lustres de casas que porventura tenham se transformado em símbolo involuntário do absenteísmo saudita. Oras, por vezes eu me pego divagando e divergindo dos meus próprios pensamentos, mas está é uma condição humana da qual nem eu, nem o mais privilegiado dos herdeiros do trono sagrado conseguem fugir.
Para finalizar, deixo aqui os meus desejos por um natal absolutamente ordeiro e pacífico dentro do possível. Lembremos que uvas passas podem ser suas amigas ou suas inimigas a depender da quantidade que você ingere ou atira em outras pessoas. A bebida está liberada, porque Jesus não transformava a água em vinho para vocês parecerem um monte de discípulos do Rei Charles em busca de uma coroa inaudita. Aproveitem esta merda e assim tenho dito.
Alfredo Chagas é ex-editor do jornal CH3 News, colecionador de centopeias, grande fã da Noruega, possuidor de um fliperama, mulherzinha da cela, gosta de camisas laranjas, amigo de orangotangos, faz dança do ventre e é ventríloquo amador.
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