As vantagens (?) brasileiras na música

Todos nós sabemos que o Brasil é um país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza. Além disso, em fevereiro há carnaval e alguns indivíduos torcem para o Flamengo e estão eventualmente casados com mulheres denominadas Tereza.

Pois bem, não contamos por aqui a presença de vulcões e estamos estrategicamente longe das placas tectônicas, o que nos mantém afastados da ameaça de terremotos e maremotos. A temperatura dos nossos oceanos faz com que tufões, furacões, tornados, ciclones e etc sejam raros em nosso território.

Some a todos esses fatores naturais a posição do Brasil no cenário político internacional - talvez a nossa insignificância - que fez com que nós não nos transformássemos em vítimas preferenciais do terrorismo internacional. Para melhorar, um mapa divulgado dia desses na internet mostrou que o Brasil - toda a América do Sul para dizer a verdade – e uma pequena curva da África são os únicos lugares do planeta que não poderiam ser atingidos por mísseis atirados pelo ditador norte-coreano Kim-Jong Un. É muita coisa boa, não é mesmo?

Provavelmente é por conta dessa tranquilidade que nós vivemos, sem precisarmos construir porões e abarrota-los com mantimentos diante do medo de uma catástrofe natural, ou pelo fato de não precisarmos passar por revistas íntimas nos aeroportos das potências que sofrem com o risco de explosões extremistas, provavelmente pelo fato de não convivermos com esse tipo de medo, que podemos fazer piada sobre os assuntos e levar tudo isso dentro do nosso jeito leve de ser para a nossa música.

Esses pensamentos, já abordados em um texto antigo do CH3, me vieram a cabeça hoje de manhã enquanto eu estava na academia e o sistema de som colocou para tocar “Olha a Explosão” do MC Kevinho. Hit nacional, viralizado pelos filhos da Madonna, a canção seria o significado da palavra horror, caso fosse composta nos EUA, no Oriente Médio, mesmo na Europa atual.

“Essa novinha é terrorista” é a afirmação que inicia a música. Vejam só que grave acusação contra uma cidadã. Em qualquer outro lugar da civilização ocidental, essa simples frase faria com que o Kevinho fosse levado para uma sala escura e submetido a interrogatórios cansativos, para que ele revelasse quem, afinal, é a terrorista que ele está denunciando na canção. Vejam que, além de terrorista, a novinha também é especialista em alguma coisa não claramente definida em um primeiro momento.
Senhor Kevinho, o senhor poderia nos apontar se alguma das mulheres com o senhor nessa foto é terrorista?

Mais a frente, Kevinho volta a dizer que ela é “muito explosiva, não mexe com ela não”, um conselho muito singular, crianças do mundo inteiro devem estar aprendendo que não se deve mexer com homens, ou nesse caso, mulheres-bomba.

O glorioso refrão vem na forma de uma alerta: “Olha a explosão”. Imagina nos Estados Unidos se do Sistema de Som de um lugar público vem a afirmação: “Look at the explosion”, ou um “mira la explosión”, ou ainda “regardez l'explosion”. Pânico, pânico, caos, correria, situação totalmente fora de controle, pessoas chorando. Apenas em um país que não vive o drama do terrorismo uma música faz sucesso com um refrão que alerta para uma explosão - nesse caso, a explosão é provocada pela bunda dinamitada da terrorista, especialista.

Vejam que, apenas no Brasil, um sujeito cujo nome é MC Bin Laden faz sucesso. O original deixou chagas abertas na sociedade ocidental, vitimou algumas milhares de pessoas em diversos países e provocou diversos traumas. Foi extremamente curioso quando os Estados Unidos proibiram a entrada do MC no país uns tempos atrás, mas não há como negar a razão dos norte-americanos nesses casos. MC Bin Laden, tal qual o seu inspirador, realiza uma espécie de terrorismo musical.

Voltando no tempo, há o lendário ritmo da banda Tchakabum, aquele da galera do avião que iria te pegar - um tema extremamente delicado em um mundo pós-11 de setembro, mas cujo refrão era “onda, onda, olha a onda (palmas ritmadas)”. Imagina uma música dessa sendo cantada no Japão, ou na Indonésia, nas Filipinas ou qualquer país atingido por tsunamis monstruosas que dizimaram a população. Um aviso de “Onda, onda, olha a onda (palmas ritmadas)” seria suficiente para provocar o caos, o pânico, correria tresloucadas em busca de um lugar alto e seguro onde as pessoas poderiam sobreviver.

Sem contar aquele clássico cuja letra era algo como “É bomba, para dançar isso aqui é bomba, blablabalababá É BOMBA, beterrababa com cenoura, É BOMBA, lavagem cerebral É BOMBA, acho que vou me matar É BOMBA”. Suficiente para, outra vez, provocar um desespero danado, sessões de interrogatório com coerção física em uma sala escura de Guantánamo.

Mas, felizmente, o Brasil, está imune a todos esses problemas e podemos continuar sofrendo apenas com alguns outros problemas estruturais, que jamais virariam uma letra de funk.

(Parte desse texto e sua ideia geral foi aproveitada de outro texto do CH3 apresentando no distante ano de 2011).

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