O vai-e-vem da Reputação e a Arte da Difamação e do Elogio

Desde que estreou no dia 25 de março de 1999, o programa Zorra Total virou um sinônimo de tudo de pior que existe no planeta Terra. Está lado a lado com a guerra, a peste, a fome e a morte em seu cavalo amarelo. Conseguiu tal posto com suas piadas repetitivas e velhas, seu humor sexista e quadros com mulheres em trajes mínimos.

O mundo vivia bem com essa informação. Até que em um determinado momento, um momento misterioso, um marco zero, alguns formadores de opinião começaram a formar uma voz dissonante em relação a esta verdade absoluta. O programa sofria de preconceito. Em seus bastidores, estavam alguns dos melhores redatores de humor da atualidade, todos vindos das brilhantes trincheiras da Stand-up Comedy. O programa teria evoluído e teria um bom nível de humor.

Claro que isso ainda está longe de ser uma opinião predominante. Ou não? O Zorra Total tem absurdos índices de audiência. Que talvez se expliquem quando vemos o comportamento das pessoas em finadas redes sociais, como o Orkut. Pessoas que devem rir sempre que escutam a claque. Mas é provável que no futuro o Zorra Total se transforme em um programa cult. Que ergue a bandeira das nossas raízes culturais, entusiasta de nossas tradições, desgastadas graças a nefasta influência estrangeira. Até que um dia, um formador de opinião diga “pessoal, acorda, esse negócio é uma porcaria”. E o programa finalmente acabe.

Esse processo de vai-e-vem da reputação é difícil de ser entendido. Ao longo dos séculos as ciências sociais têm tentado em vão compreender como ele acontece. Descobriram a presença dos formadores de opinião, dos elogiadores, dos detratores e também do carbono.

Um dos casos mais famosos é o do cantor Wilson Simonal. Ele fazia sucesso, lotava ginásios e vendia milhares de LPs. Até que ele se envolveu numa confusão da pesada com um contador do barulho. Dizem que ele mandou uns militares darem uma surra no cara. Começou um boato de que ele era um informante da ditadura. Simonal entrou em desgraça com a classe artística brasileira e sumiu da mídia, teve filhos chatos. Até que, recentemente, começou a defender-se a tese de que ele era um injustiçado, vítima de um sistema mesquinho. Tão logo, voltaram a dizer que ele era mesmo um filha-da-mãe.

Por enquanto, a imagem dele ainda é a de um pobre coitado. Mas, até quando? Vejam o caso de Monteiro Lobato. Era um grande autor infantil, mestre da literatura universal, criador de um mundo mágico. Mas agora, todos o tratam como um racista, xenófobo e o caralho. Em breve, é capaz de que pessoas comecem a queimar seus livros. Até que ele volte a ser um meigo velhinho, com novas edições de seus livros.

Pensemos em Paulo Coelho. Escritor de sucesso, imortal da Academia de Letras e mago, bruxo, o que for. Mas, o pensamento normal é de que esse seu sucesso é fruto da mesma árvore do sucesso do Zorra Total. Mas, no futuro ele pode se tornar uma unanimidade, quem sabe? Um símbolo da literatura do seu tempo. Que tinha um grande apelo comercial, mas sem abrir mão da qualidade literária. Um artista completo e revolucionário.

Voltemos ao processo do vai-e-vem da reputação e seus atores e o que se sabe sobre eles.

Os formadores de opinião são os mesmos de sempre. Ombudsmen da humanidade em geral, apresentadores de talk-show, apresentadores de jornal, donos de blog famosos e pessoas nascidas na França. Eles agem dando as suas opiniões.

Mas, para isso, eles precisam dominar a Arte do Elogio e a Arte da Difamação. Parecem coisas simples, mas não são. São finas artes que obedecem a rígido método, plenamente estudado e colocado em prática no momento decisivo. Os melhores são aqueles que conseguem a já famosa arte de elogiar destruindo.

Tente elogiar alguém. Você não vai conseguir. Vai travar. Vai escrever um depoimento de Orkut cheio de clichês sobre companheirismo, honestidade e o que mais. E de fato, é difícil elogiar sem ser piegas. A chave para o bom elogio está no momento. E esse é o momento em que a pessoa está em baixa. No mais fundo dos poços. Seu elogio não parecerá mais um aplauso bovino. Será um ato de coragem e personalidade, que dará embasamento para que o elogio ganhe força.

Também ganham força os elogios na hora da morte. Quando uma pessoa está para morrer, logo ganha tags como “Visionário”, “Democrata”, “Humanista”, “Incompreendido”. E outras coisas que farão as pessoas sentir um pesar ainda maior pela perda daquela pessoa. Vejam, que jamais na história, um mau-pai morreu.

Difamar é mais fácil, por mais que ela possa causar processo, de acordo com o Artigo 5º da Constituição. É muito fácil falar mal de alguém. Mas, outra vez, temos o momento. Uma boa difamação não começa em rede nacional, ou na capa do maior jornal do país. Ela começa num artigo obscuro. Numa conversa descompromissada. Até que a idéia difamatória vai se espalhando, se espalhando, até romper como uma bolha e se transformar numa verdade sem origem definida, arruinando a vida do difamado. Tente colocar hoje no Twitter que o Zorra Total é uma porcaria, quem sabe não dá certo.

Já o carbono, está presente na forma de moléculas.

Comentários