Análise relevante sobre o aspecto semiótico das vítima de golpes no WhatsApp

O estelionato é um crime clássico. Diria que é das contravenções mais antigas que existem, porque desde que o mundo é mundo, sempre há uma pessoa tentando passar a perna na outra. “Todo dia um otário e um malandro saem de casa” e etc, etc, etc. Adão e Eva, de certa forma, foram vítimas de um estelionato perpetrado por um réptil. Grécia Antiga, Império Romano, Revolução Francesa. Todo e qualquer processo histórico está repleto de estelionatos.

Há, de alguma forma, um charme no estelionato. Não é um crime que envolve o uso de força bruta. Não é preciso pegar uma arma e sair por aí ameaçando explodir imóveis, perfurar corpos com projéteis ou armas brancas, causar ferimentos graves em alguém. O estelionato é um crime de oportunidade, que pode ser praticado de diferentes formas e exige planejamento, capacidade de persuasão e raciocínio rápido. É um crime que, mais do que qualquer outro, se adapta aos tempos.

Hoje em dia não faz o menor sentido alguém sentar em uma praça para tentar levar dinheiro de idosos, promovendo algum truque com um passarinho. Porque ninguém mais vai à praças, ninguém mais tem dinheiro vivo e ninguém se interessa por passarinhos. A evolução tecnológica levou o estelionato aos meios digitais, passando pelas ligações com simulações de falsos sequestros, e hoje em dia está com força total no WhatsApp.
Olha a cara do meliante mandando um Bom Dia Família


Todos os dias, de alguma forma, nos chegam informações sobre pessoas que sofreram algum golpe no WhatsApp. Tiveram números ou perfis clonados, ou receberam uma mensagem de uma pessoa conhecida pedindo dinheiro emprestado. Os relatos sobre os golpes são apresentados nas redes sociais, ou mesmo nos sites de notícias. Várias autoridades já passaram pela situação e, recentemente, veio à tona a notícia de que o prefeito de Várzea Grande teve seu número clonado pela terceira vez.

Existem alguns aspectos relevantes sobre o fato de ser uma vítima de Golpe de WhatsApp. O estelionato, como já foi dito, é um crime de oportunidade. No caso do telefone clonado, isso significa que os estelionatários viram uma oportunidade em você. E isso pode ser muito bom ou muito ruim para sua autoestima.

Senão vejamos: os golpistas que saem por aí buscando maneiras de copiar números alheios, não fazem isso com a intenção de pedir nudes para os contatos, ficar de papinho semeador com as pessoas, se inteirar das informações sobre o seu ambiente de trabalho ou ser abastecido com os novos memes e figurinhas do grupo da família. O objetivo de um golpista é claro: ganhar dinheiro simulando falsos empréstimos junto a pessoas de confiança.

Dessa forma, se o seu número foi clonado, isso significa que os bandidos acham que você tem cara de quem pediria dinheiro emprestado para os outros por aí. Sim, os criminosos consideram que você é um quebrado, sem o mínimo de decoro, que se sujeitaria a pedir dinheiro emprestado para pessoas aleatórias do WhatsApp sem nem ao menos se dignar a ligar para a pessoa, fazendo isso de maneira totalmente impessoal por meio de mensagens por aplicativos. Sem nenhum choro de ligar para perguntar se tudo está bem, emendar uma conversa de meia hora antes de colocar a faca no pescoço do interlocutor. Os criminosos colocam você como um sujeito sem o mínimo de amor próprio, que se humilharia a esse ponto e pouco importa se você é prefeito de uma cidade de médio porte ou um instrutor de pilates em bairro periférico. Isso não é nada bom.

Por outro lado, você pode ter sido a segunda vítima do golpe, a pessoa a quem os golpistas invariavelmente recorreram com o objetivo de pedir dinheiro emprestado. Isso significa que a sua foto de WhatsApp e sua postura geral no aplicativo transpiram dinheiro. Criminosos desconhecidos que tiveram um breve acesso a sua imagem nessa rede social bateram o olho em você e pensaram “esse cara é cheio do dinheiro, ele teria condições de bancar 4 mil para colaborar com a organização tranquilamente”. Imagina onde não vai parar a auto-estima de um cidadão que, na visão dos bandidos, tem cacife para emprestar dinheiro para um deputado federal milionário. 

Além de rico, sua imagem é de pessoa generosa e desprendida em relação aos bens materiais, alguém disposto a bancar a caridade sem nenhuma contrapartida necessária, muitas vezes para uma pessoa com a qual você só mantém relações profissionais corriqueiras ou pessoas distantes. A Madre Teresa de Calcutá, essa é, praticamente, a visão que sua imagem no WhatsApp passa para os criminosos em um primeiro olhar.

Mas, também, a visão de alguém que é um tanto quanto otário para aceitar emprestar dinheiro para esses cidadãos de contato corriqueiro e protocolar. Nem tudo é positivo afinal.

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