Torcida Olímpica nos tempos de Cólera


Olimpíadas sempre foram um negócio razoavelmente fácil: você torce pelos atletas brasileiros, se admira com os maiores esportistas do mundo e, na ausência desses dois fatos, deseja o sucesso de alguém por pura empatia imediata. Isso mudou muito de uns tempos pra cá. Desde determinados eventos ocorridos em 2018, o sentimento olímpico brasileiro se transformou muito.

Com o advento do Instagram, podemos ter um acesso muito maior às informações pessoais dos atletas. Seus pensamentos, seu cotidiano e enfim. E descobrimos que, o esporte, em geral, é um meio bastante reacionário, adepto de discursos de soluções fáceis e muitas vezes flertando com o fascismo. Até antes de 2018, esse era um problema sem muitas consequências, mas desde então tem sido uma grande tragédia nacional. Como torcer por gente que, mesmo diante da catástrofe, segue do lado dos cavaleiros do apocalipse? Difícil.

Também ficou mais difícil torcer contra adversários. Vamos torcer para aquela americana ir mal? Pois saiba que ela foi mãe e perdeu contratos por isso, encabeçou uma disputa contra gigantes multinacionais pelo direitos à maternidade das mães, além de liderar campanhas pela saúde das gestantes. Você vai torcer contra essa mulher? Vai torcer contra uma japonesa de 12 anos? Vai desejar o mal a uma equipe de vôlei que treina em campos de terra batida?

Esporte de alto rendimento é sinônimo de sofrimento. Ser brasileiro também. Aliás, ser periférico de uma forma geral. A holandesa que tropeça e volta para ganhar sua eliminatória é uma refugiada etíope. O ucraniano que ganha a luta greco-romana é o primeiro parlamentar negro do seu país, cresceu sendo vítima do racismo. O brasileiro que chega no quarto-lugar treinava em um terreno baldio, o medalhista olímpico nadava em um açude, o canoísta não tem um rim.

Antes ninguém sabia quantos bisturis passaram pelos tornozelos, joelhos e articulações de cada atleta. Rebeca Andrade foi operada 7 vezes. Agora todo mundo saberia o duro que você deu, Simonal.

A cada hora entram em cena atletas representantes de cada letra do LGBTQIA+, defensores da caridade, pessoas que fazem a diferença na vida de outra, ou que simplesmente sofreram demais. E outros que fizeram merda demais. É muita informação para ser processada e julgada na hora da nossa torcida.

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