Mercado Editorial F*da

Como todo e qualquer segmento econômico, o mercado editorial está sempre antenado as últimas tendências do consumidor. Pesquisas são realizadas constantemente para saber quais produtos terão uma maior aceitação do público e não é por outra razão que repentinamente temos a sensação de que todos os livros de uma vitrine de livraria são iguais. Já tivemos a época dos contos eróticos para mulheres casadas, aquele período em que parecia que Mário Sergio Cortella era o único autor vivo brasileiro e agora passamos pela Era da Foda.

Em um primeiro momento, falando desse jeito, parece que este é um retorno a época dos 50 tons de qualquer coisa. Mas a foda aqui não é no sentido literal, do coito casual ou matrimonial. É uma foda existencial, um estado de espírito, uma mentoria coach que te ensina a olhar no espelho e repetir “eu sou foda”, dar um foda-se para todos os problema e a partir daí viver livre, leve e solto como se fosse um comercial de absorventes.
Nem precisei fazer a montagem: o UOL fez antes.

Acredito que tudo começou com a obra “A sutil arte de ligar o foda-se” de Mark Manson, autor norte-americano de autoajuda, consultor de desenvolvimento pessoal e empreendedor. Depois de encher o rabo de dinheiro com o alfarrábio, ele lançou seu segundo livro “Fodeu Geral”, que poderia ser a nova música do Jerry Smith, mas é uma mensagem de esperança, dizem.

A moda chegou ao Brasil e Caio Carneiro – empreendedor, investidor, palestrante e pai de família exemplar – lançou duas obras: “Seja Foda” e “Enfodere-se”. Talvez sinais destes tempos em que vivemos, no qual falar palavrão é uma maneira de demonstrar simplicidade e desta forma se aproximar do Brasil profundo.

Bem, tendências são tendências e devem ser respeitadas. No entanto, acredito que em breve haverá um esgotamento da palavra Foda, aliás, acredito que as possibilidades já se esgotaram, porque os interessados no assunto já ligaram o foda-se, já estão sendo fodas e se enfoderaram o suficiente para perder tempo lendo livros. No entanto, o mercado está aberto para a entrada de novos palavrões. Eis aqui sugestões para alguns novos lançamentos editoriais.

A sutil arte de mandar tomar no cu
Mandar alguém tomar no cu talvez não seja algo sutil e muito provavelmente seria uma arte maldita. Mas, nesta obra poderíamos aprender melhor que em vários momentos tudo o que precisamos é mandar alguém tomar no cu, nem que seja só para transferir o stress do nosso corpo para uma pessoa que não tem nenhuma relação com os nossos problemas e vai passar a sofrer em prol da nossa saúde mental.

Descaralhe-se
Você se senta constantemente pressionado pela sociedade a dar algum retorno para todo o capital humano e financeiro investido em sua pessoa? O medo do fracasso está constantemente te sufocando? Então você precisa se descaralhar, o que pode ser considerado uma maneira de tocar o foda-se, mas de maneira nem um pouco sutil.

Seja um filho da puta
Cansou de tomar no cu sozinho? A solução talvez esteja em passar para o outro lado da força e atuar de uma maneira que quem vá se dar mal são as outras pessoas, que não você. Para isso, você precisa parar de ser bonzinho e de procurar justiça.

Tomamos no cu
Aconteceu. Tomamos no cu. E agora? O negócio é olhar pelo lado positivo, uma vez que, depois que tomamos no cu, nada pode piorar e o único caminho é passar a botar no cu dos outros. Ok, na verdade não é bem assim e tudo pode sempre piorar, mas nós não precisamos informar isso aos nossos leitores.

Pau no cu da sociedade
A sociedade te pressiona a estudar, casar, ter uma família exemplar e estabilidade financeira? Pau no cu da sociedade. Se mude para uma área inabitada e construa sua própria civilização, onde você será o único com direito de exercer os poderes de coach.

Embucete-se
Que sorrir o que meu irmão? O negócio é ficar embucetado para todo mundo saber que não deve passar pelo seu caminho. Não gostou? Enfia a dentadura no cu e sorri pro caralho porra.

Ainda há possibilidade de relançarmos clássicos da literatura mundial com títulos FODAS para atrair uma nova geração de leitores, que talvez não se interesse por essas velharias.

Memórias fodas de Brás Cubas
Brás Cubas relembra os segredos do seu sucesso sem nunca ter trabalhado na vida.

O fim foda de Policarpo Quaresma
Exemplo prático de que, quando você resolver inovar, tem que estruturar bem a sua ideia, para não correr o risco de resolver mudar o idioma nacional. Mas, não importa, sempre é possível aprender com os próprios erros, desde que você não morra como o nosso personagem.

A mulher de 30 anos que ligou o foda-se
Certamente será um sucesso de vendas a história dessa mulher emfoderada. O que poucos sabem é que quem tocou o foda-se mesmo foi o Balzac, que terminou esse livro igual a cara dele.

Dom Fodón de la Mancha (Ou Dom Quixote que se Foda)
Pare de perseguir moinhos que não existem. Já parou para pensar que se Dom Quixote tivesse ligado o foda-se uma das maiores obras literárias de todos os tempos jamais teria sido lançada e você não precisaria se culpar por nunca ter lido?

A metamorfoda
Certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos e se viu metamorfoseado na figura de um terrível inseto. O que ele fez? Disse “foda-se, sou uma barata” e viveu assim até sua morte banal. É tudo uma questão de mindset.

O Caralhudo Gatsby
Uma ótima explicação do porque Nick Caralhaway é tão apaixonado assim pela figura polêmica de Jay Gatsby, um empreendedor de sucesso. Estaria ele em busca de uma mentoria?

100 anos de Descaralhamento
Uma ótima explicação para todas as tragédias que assolam Macondo com suas pessoas que demoram para morrer, se transformam em árvores e coisas do tipo.

Uma comédia do caralho
Pode ser tanto a obra de Dante Alighieri quanto um novo filme nacional com Leandro Hassun e Whinderson Nunes.

Moby Caralho
Uma espécie de tradução literal do nome da baleia cachalote que frustrou tantos sonhos sanguinolentos de marinheiros infelizes.

Ensaio sobre a puta que o pariu
Até José Saramago perdeu a sutileza.

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