O Fantasma do Comunismo

Nascido em 1917, o Fantasma do Comunismo ainda está na ativa. Apesar de já ter passado por dias mais gloriosos, quando derrubava um governo sul-americano por semana e provocava grandes e sangrentas guerras (“tempo bom, que não volta mais”, cantarola como se fosse aquele humorista da Praça é Nossa - seu programa predileto), o Fantasma ainda assusta as pessoas.

Para conversar com esse personagem emblemático da história universal, a equipe do CH3 foi até Santa Bárbara do Oeste, no interior paulista, onde ele vive atualmente. Quando pergunto por que ele escolheu viver na cidade ele diz “adoro esse nome, Bárbara” e ri. Depois diz falar sério e que a escolha é uma homenagem ao inesquecível esquadrão da União Barbarense de 1999. Ri novamente, nessa que é uma de suas grandes características: responder com piadas nas duas primeiras vezes e falar sério apenas na terceira.

A explicação oficial é que fazia muito frio em Vladivostok, sua antiga casa. E, aos 101 anos, mesmo um fantasma tem problemas nas juntas e articulações. “Recomendações médicas”. Além disso, o tempo na Rússia não anda bom para um fantasma do comunismo. “Hoje o Putin me persegue. E pensar que nós fomos parceiros, já demos muito susto em muita gente”.

O Fantasma do Comunismo segue sendo considerado uma ameaça por boa parte dos eleitores brasileiros. Você ainda se considera uma ameaça?
Olha, os meus melhores dias já passaram. Antes eu tinha uma rede de apoios mundial, mas eu nunca me considerei uma ameaça. Eu não seria capaz de matar uma única pessoa, eu sempre gostei de dar uns sustos. É algo inerente à minha condição de fantasma.

Como é que era sua atuação?
Os sustos? Bobagem pouca. Eu gostava de ir na casa das pessoas de noite, porque as pessoas são mais suscetíveis quando estão dormindo. Não dizem que a alma saí do corpo? Então, eu ia lá no ouvidinho da pessoa que estava naquele sono profundo e dizia “abaixo à propriedade privada” e saía correndo. A pessoa acordava naquele susto sem saber o que era. Outra que eu gostava de falar era “a revolução do proletariado está chegando”.

Onde é que você dava esses sustos?
Eu atuei bastante no Brasil na época do governo do Jango. Ia na casa daquele povo todo do TFP e ficava falando “os camponeses estão chegando”. Acho que aqueles putos nem sabiam o que era camponês. Mas eu gostava muito é dos Estados Unidos. Sempre adorei a América. Nova York, Chicago, todo aquele centro-sul deles, sempre fui apaixonado pela música country de raiz. Hank Williams, conhece? Era uma diversão ir na casa daquele povo do Texas e deixar panfletinho da foice e do martelo na carteira do cara, só para ele ficar com medo de ser pego pela polícia. Os anos 60 então foram muito loucos, muito ácido, eu fiz muitas loucuras.

Que tipo de loucura?
O que eu fiz com aquele rapaz, o Elvis Presley, eu não faria com ninguém. Tenho vergonha de falar e prefiro me abster. Acho que fui o responsável por ele ter se viciado em remédios. Mas aquela bad trip toda foi fruto também da depressão depois da morte do McCarthy. Eu adorava ir na casa dele e ficar sussurrando o nome de pessoas que fariam parte do partido comunista americano e que ameaçavam fazer uma revolução proletária. Grande figura o McCarthy. Acordava suado toda a noite.

Você me disse que ainda dá os seus sustos. Quem são suas vítimas hoje em dia?
Elas são muito ocasionais. Hoje em dia eu não tenho mais a agilidade de outros tempos, não consigo mais passar em qualquer fresta. Mas eu gosto muito de assustar aquele rapaz, o Bolsonaro. Nesses dias que ele estava no hospital eu ia lá ficar falando “vamos molestar criancinhas”, “os sem-terra estão na sua porta”. Mas não tem muita graça, ele diz coisas que eu não seria capaz de falar nem depois de um porre de vodka original russa. Já bebeu vodka original russa? É outra coisa.

Os eleitores do Bolsonaro falam em expulsar o Fantasma do Comunismo do Brasil, como você vê isso?
Acho uma injustiça e uma falta de visão política. Já ajudei eles a ganhar muita eleição e é assim que eles me tratam? Quero ver se teria tido golpe em 64 se eu não estivesse lá. Mas, eu estou acostumado com essa perseguição e me envaidece muito que as pessoas reconheçam minha importância, mesmo eu estando bem velho e carcomido. Se tiver que sair do Brasil, eu saio, já me mudei várias vezes. Já estou vendo de comprar uma propriedade na Jamaica.

Quer dizer então que o Fantasma do Comunismo tem propriedades? Ele explica que sim. Não vê nada contra isso e que Marx e Lenin exageraram muito nessa história deles. Mas então ele não é comunista? “Sou profissional”, concluiu.

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