Fantasy do Congresso

Faz um tempo os Fantasy Games dominaram o mundo dos esportes. O passatempo consiste, basicamente, em se transformam em um gerente esportivo que precisa montar uma equipe forte com um orçamento limitado. Os atletas somam pontos positivos ou negativos de acordo com uma série de critérios e a partir disso se valorizam ou desvalorizam. Fez um gol ou deu um drible, marca pontos. Errou um passe ou levou cartão vermelho, perde pontos. Nos esportes americanos, que são permeados por uma série de estatísticas incompreensíveis, deve ser quase impossível acompanhar. O desafio se repete a cada semana.

Os jogos fantasy se tornaram uma nova maneira de acompanhar o esporte. Ao invés de apenas torcer pelo seu time ou por um atleta pelo o qual você tenha simpatia ou atração sexual, você começa a torcer pelos atletas escalados no seu time. Vibra a cada drible acertado, atira objetos contra a parede em cada falta cometida, se masturba no gol marcado e enfia os braços dentro do cu e bate palma em uma expulsão.

O grande exemplo nacional é o Cartola FC®, o Fantasy Game®, oficial da globo.com® e do Campeonato Brasileiro de Futebol®. Brincadeira despretensiosa até uns anos atrás, se tornou uma febre e, como toda febre, tem seus sintomas. As notícias sobre a pontuação dos jogadores dominam os noticiários dos grupos Globo, os locutores repassam informações sobre quantos pontos o Fulaninho Carioca está marcando, o tempo inteiro se fala que alguém “mitou”¹, há quem pague para participar e, sabe-se lá como, é possível zoar os coleguinhas que foram mal na rodada. Os jogadores que não jogam bem em uma rodada são hostilizados nas redes sociais. Quem marca um gol e prejudica a pontuação alheia é ameaçado. Sim, isso precisa parar.

Mas é claro que não vão parar, porque os FGs renovam a atenção do público jovem para o esporte. Tanto que a minha sugestão é que criemos um novo Fantasy para melhorar o país e atrair os jovens para causas importantes:

O Fantasy do Congresso.

O regulamento ainda precisa ser aprimorado, mas o jogador teria uma verba para comprar um grupo de parlamentares, digamos que sete deputados e dois senadores – o que cria um paralelo com a vida real e talvez o jogo pudesse se chamar “Você empreiteiro” ou “O Príncipe do Planalto”. Cada parlamentar teria um preço de partida diferente, de acordo com seu status dentro do congresso. Os do PMDB, do centrão, da bancada ruralista, em 29º mandato são mais caros, assim como os mais midiáticos. Deputados com pouco poder de barganha, ilustres desconhecidos, suplentes e o baixo clero são mais baratos.

Isso leva a uma série de dúvidas: da mesma forma que você não pode escalar a seleção norte-americana no fantasy da NBA, você vai poder comprar todos os figurões do Congresso de uma única vez. Resolveu ter um Renan Calheiros no seu time? Não terás Jucá. Vai ocupar o resto do seu orçamento com parlamentares de partidos pequenos do Espírito Santo, Acre ou Sergipe. Para ter um Dream Team do Congresso, você terá que apostar em um parlamentar barato e promissor e esperar que ele se valorize para conseguir dinheiro com sua venda e somar valor ao seu elenco.

Uma vez que os parlamentares estiverem escolhidos, você dará um nome para sua bancada, tipo “Bancada Sinistra”, ou “Bancada Cavalcante”². Ok, mas como ocorre a valorização ou desvalorização dos congressistas? Sim, seu valor e sua pontuação serão definidas de acordo com a atuação do parlamentar durante a semana. Proposituras somam pontos, projetos aprovados somam pontos, obstrução de votação soma ponto, discurso soma ponto, participação em comissões, relatorias, enfim. Claro, pontuação atribuída de acordo com um ranking de importância pré-estabelecido.

Por outro lado, pontos são descontados com faltas, projetos reprovados, mandados de busca e apreensão, citações em delações premiadas, condenações. No caso de ausência parlamentar continuada, a pontuação negativa acumula. Faz dezesseis semanas que o político não faz um discurso, não apresenta uma propositura, não participa de um discussão? Dezesseis pontos negativos na conta dele.

E porque isso mudaria a maneira como o jovem lida com a política?

Porque ele passaria a acompanhar o Congresso. Escolheria um deputado para seu time porque nessa semana tem boas chances que um projeto dele sobre segurança alimentar seja aprovado. Desistiria de um determinado parlamentar porque viu que ele falta muito ou que não apresenta nada de produtivo. Prestaria atenção naqueles que estão ali, toda semana somando seus pontos. E mais: pressionaria. Xingaria o senador que não fez nada de útil na semana. “Detonou o meu Príncipe do Congresso nessa semana, fdp”, “não consegue aprovar um projeto, seu arrombado”, “falhou nas articulações políticas, nunca mais te escalo na minha bancada”.

Ao invés de apenas torcer por um parlamentar pelo o qual você tenha simpatia ou atração sexual, você começa a torcer pelos que estão escalados no seu time. Vibra a cada projeto aprovado, atira objetos contra a parede em cada falta de sessão, se masturba com uma presidência de comissão, enfia os braços dentro do cu e bate palma em uma prisão.

Tudo isso com a oportunidade de zoar os amigos na segunda-feira e mitar como o articulador político da semana.

Alguém compre essa ideia.

¹Vejo nisso uma perigosa associação entre os jogadores de Cartola e o candidato J. Messias.
²Isso caso seu sobrenome seja Cavalcante, ou caso você tenha uma simpatia por esse sobrenome. Escolha meramente aleatória.

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