A tática canina de Tite

Estávamos em julho de 2014 e o cadáver do futebol brasileiro nem sequer havia esfriado. As lembranças do 7x1 e daquela derrota que é uma obra de arte - convenhamos, é extremamente difícil perder da maneira que a seleção brasileira perdeu - ainda invadiam a mente da população, quando a Confederação Brasileira de Futebol anunciou quem seria o novo comandante da seleção nacional: Dunga.

Foi um momento de perplexidade geral. Clicávamos nos links que anunciavam a notícia para ver se não era uma daquelas pegadinhas, que colocam notícias antigas como se fossem atuais. Caralho, o Dunga, o cara teve uma passagem terrível pela seleção quatro anos antes, passou quatro anos sem fazer nada que preste e de repente estava lá de volta na seleção. Só uma pessoa longe dos plenos domínios de suas faculdades mentais faria essa escolha, mas ela realmente foi feita. Não podia dar certo e realmente não deu.

Depois de dois anos de resultados medíocres, atuações pavorosas, e a impressão de que o futebol brasileiro havia acabado, Dunga foi mandado embora. No seu lugar, assumiu outro gaúcho, Tite, que ao contrário de Dunga, tinha ótimos resultados clubísticos nos últimos anos e despontava como o melhor técnico do Brasil. Como se fosse um milagre, a seleção de Tite começou a ganhar um jogo após o outro, o que só potencializou a ruindade do Dunga. Sério, se eu fosse o Dunga eu nem sairia mais de casa, porque ficou comprovado que ele é provavelmente o pior técnico de futebol do planeta.

Pois bem, o fantástico desempenho dos comandados de Adenor Bacchi elevou a moral do povo brasileiro, mas nas rodas especializadas ainda discutimos as possíveis evoluções táticas para que o time siga evoluindo e consiga, quem sabe, além de vencer partidas e campeonatos, resolver complexos teoremas matemáticos durante as partidas.

Além do desenvolvimento de triangulações de base alta, flutuações laterais da linha de defesa, reposicionamento do zone-press coercitivo, alternância de intensidade programada, ataque posicional e construção individualizada das coletividades, o técnico Tite demonstrou no jogo desta última terça-feira contra a Colômbia sua nova arma tática que é a utilização de um cachorro para desnortear o sistema defensivo adversário.

A presença de cães nos gramado é uma tradição futebolística sul-americana. Desde que alguns pioneiros voltaram da Inglaterra com material esportivo contrabandeado em navios e ensinaram as leis do esporte para uma população talvez desinteressada, os cães são uma presença constante nos jogos disputados no continente. No entanto, até ontem, os cachorros eram apenas um fator de aleatoriedade na partida. Coube a Tite, trazer uma sincronicidade para a invasão canina.

Vamos relembrar os fatos: Brasil e Colômbia faziam um jogo duro sob o sol escaldante de Barranquilla. O primeiro tempo estava prestes a terminar sem nenhum gol marcado, quando Tite mandou um cão ao gramado. Podemos observar no vídeo e nas imagens toda a movimentação do cão, que apareceu livre na meia-lua esperando um passe de Neymar - que não veio. Neymar foi para a linha de fundo e o cão fez o movimento de facão, passando por trás do colombiano. A jogada originou um escanteio, que demorou a ser cobrado, porque o cão não conseguia ser retirado de campo.
Neymar recebe na ponta direita e cachorro aparece livre pelo meio, se mantendo atrás da linha de impedimento. Inteligência tática.
No ataque seguinte, já nos acréscimos, o Brasil se aproveitou da indecisão da defesa colombiana, certamente insegura quanto a presença de um cachorro sem marcação em campo e aproveitou o espaço deixado pela movimentação canina para marcar o seu gol. Certamente os colombianos ficaram confusos com o cachorro e provavelmente até mesmo com medo de serem mordidos.
Cachorro se apresenta como opção para tabelinha ou para cruzar a bola na área. Visão de jogo.
A inovação tática de Tite leva a uma série de reflexões. Sabemos que o futebol é disputado por dois times de 11 jogadores e a entrada de qualquer outro ser humano é uma infração a regra. No entanto, não há nas 17 leis que regem o jogo nenhuma restrição a utilização de cães como um 12º elemento.
O cão se livra da forte marcação colombiana para ficar livre em campo. Movimentação.
No entanto, a movimentação canina é ainda muito incipiente e pudemos perceber a falta de aplicação tática do cachorro que, após não ser acionado por Neymar em dois momentos consecutivos, desistiu completamente do seu posicionamento e saiu correndo para o campo de defesa brasileiro. O desafio de Tite é, com as modernas técnicas de adestramento animal, conferir disciplina tática aos cães, para que eles tenham uma atuação ainda mais incisiva.
No tradicional agarra-agarra, cachorro mostra que tem muita força-física e que não é facilmente intimidado. Raça.
Outro problema é que a Copa do Mundo do ano que vem será disputada na Rússia, país que não tem tanta tradição canina nos gramados. Além disso, os russos são adeptos de soluções pouco diplomáticas e não dúvido que eles seriam capazes de sacrificar o cachorro dentro do gramado, para que ele fosse finalmente retirado.

Mas convenhamos que a utilização do animal em campo deve ser muito mais eficaz do que aquela experimentada por Dunga com Felipe Mello na Copa de 2010.

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