Peixes Malditos

Recentemente, o apresentador, ator e protótipo de marido ideal, Rodrigo Hilbert, provocou polêmica em seu programa de culinário transmitido por um canal de TV paga cujo nome é formado por três consoantes do alfabeto romano. Tudo porque, ao investigar os hábitos alimentares dos povos que habitam o interior de Santa Catarina, ele e um outro caipira de lá mataram um carneiro, esquartejaram-no, assaram-no e serviram-no com acompanhamentos.
Não sei por quais razões, mas esta foto me lembrou...

O programa chocou por trazer a tona uma verdade inconveniente. Precisamos matar os animais para nos alimentarmos deles, pelo menos os animais de grande porte. Você pode comer insetos e pequenos animais enquanto eles ainda estão vivos, mas esta tarefa será muito difícil de ser realizada com um boi.

A morte pode ser provocada por uma pancada na cabeça, pela degolação, com a incisão de um objeto cortante em um ponto vital, pelo mergulho em água fervendo, enfim, são muitas as maneiras que nós encontramos para assassinar um bicho. Rodrigo Hilbert, se eu não me engano, preferiu a morte por incisão de objeto pontiagudo no corpo do animal. O golpe fatal não foi televisionado, os editores preferiram apenas cenas lúdicas de um balde recebendo todo o sangue que escorria do cadáver. Mas a polêmica se instaurou.

O fato é que a maioria de nós, carnívoros, queremos manter uma relação profissional com o nosso alimento. Não queremos saber que eles tiveram uma vida, que alguém precisou acabar com essa vida para que ele estivesse ali grelhado em nossa mesa, acompanhado de arroz, molho e batatas. Se nas embalagens de carne estivesse escrito que esse coxão mole pertenceu a Mimosa, filha de Rufalos III e Princesa, que ela mamou por três meses, que viveu em campos verdejantes por um ano, até que o seu Tobias acertou uma paulada na cabeça dela, possibilitando que este pedaço de carne esteja nessa gôndola, bem, se o mundo fosse assim, aposto que o número de vegetarianos aumentaria consideravelmente. Quando a Friboi fala da origem da carne, ela não fala de uma origem completa. Apenas a origem mercadológica.

Rodrigo Hilbert poderia ter chocado ainda mais as pessoas se, assim quando ele laçou o carneiro que seria morto, ele o pegasse no colo, se dirigisse a câmera e falasse: “Gente, esse aqui é o Pipo. Diz tchau pra câmera Pipo. Então, o Pipo é que a gente vai matar e vai assar ele. Tchau Pipo, diz tchau pra vida, Pipo”, com voz infantil. Sim, você não aguentaria isso.

Aproveito esse tema para voltar a um assunto que já foi discutido neste blog não muito tempo atrás. Por que nós não nos importamos com os peixes. Na verdade, cagamos para os peixes.

Nesse programa, Hilbert já matou sapos e também já pescou muitos peixes. Foi em alto mar, fisgou uma dúzia de peixes, matou-os e os serviu aos seus convidados. Ninguém, absolutamente ninguém fez textão no Facebook, nenhum post no Buzzfeed foi criado e enfim. Permanecemos insensíveis a vida dos peixes, que são tão seres vivos como nós. Assim como o carneiro, viveu uma vida inteira até o momento em que foi capturado por um ser humano que o matou e o levou ao fogo.

Imaginem se Hilbert, ao laçar o carneiro, ficasse dando corda para ele, deixando-o correr de um lado para o outro e ficasse narrando a cena “ô bichão, esse é briguento. Mas não escapa não”. Depois mergulhasse o bicho numa piscina e o deixasse agonizando lá, até a morte. Provavelmente a Luiza Mell se materializaria na casa dos Hilbert, o caso iria para a Justiça e ele seria preso. A lei da prisão definiria um fim cruel para o galã global.
...esta daqui.

Pois, existem programas de pesca que fazem exatamente isso. Ferem animais, os deixam desesperados lutando pela vida, os sufocam e podem até eventualmente devolve-los ao seu habitat, mas após uma experiência traumática. Não é estranho. Por que ninguém fica chocado? Por que essa indignação seletiva?

O Instagram do homem que representa a personificação do marido ideal, foi invadido por pessoas que o chamaram de idiota, questionaram o que ele acharia se fizesse isso com os filhos deles. Isso, no caso, é inserir um objeto pontiagudo no corpo de um de seus filhos, que depois seria esquartejado, assado e servido com batatas em um moderno e complexo ritual canibal.

Pois bem, ninguém jamais perguntou para um cara de programa de pesca o que ele acharia de os filhos deles ficarem enganchados em um anzol, nadando de um lado até o outro por horas até morrerem asfixiados. Pensem nos peixeis.

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