A Sinfonia dos Objetos

Quando se é criança, o mundo inteiro é um enorme desconhecido. Há grandes mistérios absolutamente incompreensíveis e na verdade, alguns deles continuam sem uma explicação lógica até os tempos atuais. Um deles: por que os objetos fazem barulho?

Sim, existem diversas coisas que fazem barulho. Outras pessoas, outros animais, diversos objetos, principalmente quando entram em contato com outros objetos. Facas fazem determinado barulho no momento em que cortam a a pele, a carne ou os ossos humanos, por exemplo. Mas, em hipótese nenhuma, deveriam fazer barulho quando estão adormecidas em gavetas, em cima da pia ou escondidas dentro de bizarros bonecos que foram sucesso nos anos 80.

Mas o fato é que muitos objetos aparentemente inanimados provocam os mais diversos barulhos, de maneira que pode parecer aleatória, mas que no fundo é bem ritmada. Portas, mesas, janelas, eletrodomésticos ligados na tomada, todos emitem sons em um determinado período de tempo.
Dobradiças tem um timing perfeito para fazer barulhos no meio do silêncio, aparentemente sem terem sido provocadas para isso

Quando você era uma criança inocente e inútil, já deve ter passado alguma noite em claro a escutar um misterioso estalo em algum lugar do seu quarto. Nem sequer abriu os olhos e se cobriu até onde pode, haja visto que na lógica infantil, o lençol é o melhor escudo do qual o ser humano pode dispor.

Com o tempo, vamos deixando esses medos de lado, porque crescemos, amadurecemos, mas também porque nos acostumamos com os barulhos que a casa faz. Sabemos que aquele estalo foi apenas a janela que se moveu de acordo com uma determinada carga de energia que se colocou sobre ela, fazendo com que suas dobradiças mexessem com algum atrito. Aquele roçar na janela é apenas um galho de árvore que a cada seis minutos e meio esbarra por ali. O grito que vem da rua é apenas o serial killer do fim da rua fazendo sua primeira vítima em sete meses. O ouvido se acostuma. É como aquele chiado praticamente imperceptível da televisão, mesmo quando ela está no mudo.

Quando você se muda para uma casa nova, tudo muda. Seus ouvidos e seu cérebro ainda não estão acostumados com os barulhos que a nova residência pode fazer. Assim sendo, você ainda não processou a informação de que aquele estalo seguido de três pequenas vibrações é o motor da geladeira e não alguém que arrombou a porta e quicou por três vezes no chão ao entrar. As duas pancadas fortes que vem da rua são a tampa do bueiro solta pela qual um carro passou por cima e não o serial killer do fim da rua que rachou a tampa craniana de alguém com dois golpes secos de pedra.

Os barulhos se repetem de maneira ritmada ao longo da noite e todos eles te provocam estranhamento. Não há muito o que fazer, a não ser distrair a mente enquanto arrombamentos imaginários invadem sua cabeça.

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