Previsões, Perdas e Danos - Parte 4

Diante daquele cenário só nos restava tentar entender o que havia acontecido depois que o Dolly com frutas cristalizadas entrou em nosso organismo. Precisávamos de alguma forma encontrar o Tackleberry. Pensei que deveríamos ligar para ele, então ele atenderia o telefone diria onde é que ele estava ou então alguém atenderia o telefone e diria o que estava acontecendo e um dia nós ainda iríamos rir muito disso tudo. O celular sempre nos cria uma ilusão de que irá resolver todos os problemas da nossa vida.

Vinícius discou os números e no momento em que seu celular completou a ligação, um telefone começou a tocar em cima do balcão do bar. Por alguma razão, todos nós resolvemos sair do Carnicentas sem levar nossos celulares. Será que temíamos um rastreamento? O que temíamos? Perguntei ao Vinícius:
- Você tem o telefone do L...
- Nem.
- É, aí complica.
- Sem dúvida.
- Mas, pensando bem...
- É, ele sumiu durante seis anos, não faz diferença se ele sumir mais seis.
- Segunda ele aparece lá no seu trabalho, ele sobreviveu ao interior do estado esse tempo todo.
- Verdade.

Encontrar o Papai Noel e o Hanz nem era uma grande preocupação. Talvez o primeiro fosse o responsável por tudo e o Hanz deveria estar preso novamente. Aliás, seria muito mais fácil se ele permanecesse preso o tempo inteiro. Pai Jorginho de Ogum disse que ele tem até o telefone da Delegacia de Crimes Sexuais, que sempre liga até lá nos períodos em que o Hanz desaparece. Pedi para ele fazer isso e não deu outra, ele estava lá e o delegado perguntou quando é que alguém ia busca-lo.

Borboleta deu a sugestão de que nós deveríamos ir até a delegacia buscar o Hanz e tentar entender o que é que havia acontecido. Refutei a ideia, Vinícius também. Se saíssemos com Hanz novamente, iríamos começar um novo ciclo de terror e nunca mais conseguiríamos resolver nada, passaríamos o resto das nossas vidas apenas tentando nos salvar.

O telefone de Tackleberry começou a tocar novamente. Olhamos no visor e conferimos que já eram 12h37 e que quem estava ligando era o seu irmão, o popular Senhor M. Atendi e falei que Tackleberry estava no banheiro. Senhor M pediu que avisássemos para que ele voltasse logo, a família estava esperando-o para o almoço. Respondi que ele não precisava se preocupar.

Vinícius comentou que deveríamos olhar no carro e ver se encontrávamos alguma pista. Falei que era uma boa ideia, que esse é um clichê de filme que geralmente dá certo. Sempre pode ter alguém preso no porta-malas e tudo mais. Era hora de ir para a rua. Nos despedimos daqueles que ainda ficavam, menos de Alfredo Chagas que continuava dormindo abraçado numa garrafa de uísque paraguaio. Enquanto saíamos, Alfredo Humoyhuessos soltou o tema de Armageddon nos alto falantes do bar. Este velho anda muito brincalhão, alguma coisa aconteceu com ele.

Dentro do meu carro havia um livro sobre a história de Mato Grosso e alguns panfletos da City Lar. Mas, eles não diziam nada, já que estavam ali há algum tempo. Sim, estou precisando limpar o meu carro. Não havia nada de interessante ou que pudesse ajudar. Vinícius abriu o porta-malas e o clichê se completou, o Papai Noel estava lá dentro. Se masturbando. Rapidamente ele se recompôs e disse “ho ho ho, porra, feliz natal seus filhos da puta”.

Por um momento pensei em vender o carro. Pensei que merda estava acontecendo. Diante do silêncio meu e do Vinícius, o Papai Noel falou “que foi porra, nunca viram o saco do Papai Noel”. Questionei apenas que era um tanto quanto doentio se masturbar trancado no porta-malas de um carro. “Você não conhece nada da vida, porra”, o Papai Noel disse.

Gaguejando levemente, Vinícius perguntou se ele havia tomado Dolly com frutas cristalizados e o Papai Noel respondeu “olha pra minha cara porra, vê se eu tenho cara de quem toma uma merda dessa”. Quer dizer então que ele se lembrava do que aconteceu de noite? Ele disse que sim, que nós tínhamos ido curtir a vida e perguntou se eu tinha isqueiro, fazia um tempão que ele não fumava um. Respondi que não e ele disse “merda”.
- Eu me lembro de tudo o que aconteceu. Pelo menos até o momento em que vocês me pegaram desprevenido e me trancaram no porta-malas.
- Quando é que isso aconteceu?
- Quando nós paramos para ver o sol nascer na estrada pra Jangada.
- Caramba, nós estávamos em Jangada?
- Vocês não lembram? Fomos até lá para tentar comer um pastel, mas estava tudo fechado.
- E quem trancou você no porta-malas?
- Não sei porra, eu estava de costas na hora em que isso aconteceu.
- Mas, quem estava lá em Jangada?
- Vocês dois, aquele adolescente delinquente... um cara que vocês chamavam de Taco e outro cara estranho.
- E o Hanz? O Pansexual.
- Argh, aquele velho filho da puta.
- Ele também estava em Jangada?
- Não, ele já tinha ficado pra trás. Acho que foi depois daquela briga que teve no Centro Político.
- Briga?
- Porra, vocês não lembram? Vou dar uma mijada e já volto.

Continua

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