Vinho Tinto e Exposição Pública na Internet

Por volta das 23h uma aluna resolve dar em cima de um professor. Ele retribui essa investida de maneira positiva, convidando-a para tomar um vinho em sua casa. Então, ocorreu a conjunção carnal entre os corpos docente e discente. Acontece que a aluna tinha um namorado, desconfiado. Ele acabou descobrindo tudo e, tomado de fúria e com sua honra manchada, deu publicidade ao caso.

Uma história aparentemente normal de sedução e traição que deve acontecer todos os dias em vários lugares do mundo. Aposto que neste exato momento, em algum canto da América Latina, um professor está servindo vinho tinto para uma aluna. O objetivo? Não sei. Talvez seja para passar de ano, talvez seja amor, apenas desejo.

O anormal no caso citado é que tudo aconteceu no Facebook e se está no Facebook, está diante dos olhos do mundo. Em poucos segundos, até mesmo Barack Obama já sabia dos sórdidos detalhes da história. O flerte, as cutucadas não respondidas, o convite para um vinho tinto suave Sinuelo, a oferta de uma carona em um Ranger Prata cabine simples. Que o ato seria possivelmente confirmado em uma casa bagunçada.

Sabemos o telefone e o endereço dos envolvidos. Sabemos que ele escreve “celolar” e que é ruim de papo. Todos nós nos irritamos a cada repetição sua de que o “o mundo é dos loucos rsrs”. Sabemos que a menina fez um doce danado, durante mais de uma hora, ponderando se deveria ir ou não. Sabemos que ela tem um gato e mora com sua tia inquisitiva. Só não sabemos se ela foi aprovada ou não na autoescola no dia seguinte.

Em outros tempos, esta seria a tragédia solitária na vida de um homem. O homem traído que busca consolo na bebida e na música sertaneja, ou que poderia multiplicar essa tragédia com um duplo homicídio seguido de suicídio. Em outros tempos, ele poderia no máximo pregar cartazes dizendo que sua namorada era uma vagabunda, mas o fato ficaria isolado e ridicularizado em sua comunidade. Mas ele divulgou o caso via Facebook, no próprio perfil da namorada e ganhou o mundo.

O Gazzag ajudava você a orga-
nizar sua vida social. O proble-
ma é que, ao que saiba, nin-
guém jamais usou o Gazzag.
Isso revela que no mundo atual é impossível viver uma tragédia de maneira isolada. Sempre haverá alguém com uma câmera para filmar você brigando na porta da boate. Alguém gravará você bêbado no ônibus e logo você estará no Youtube, no Facebook, Twitter, Orkut, MySpace e Gazzag. Você será transformado em memê e o G1 vai fazer uma matéria sobre você. Você será reconhecido na rua e não terá mais paz. Você pensará “puta que o pariu, eu não queria que nada disso estivesse acontecendo”.

No advento da lei Carolina Dieckmann, os responsáveis por te expor na internet podem sofrer com as graves consequências legais. Funciona bem no caso de roubo de suas fotos pelada numa privada. Não sei se funciona se alguém pegar uma conversa sua no Facebook e publicar.

No caso da história do professor enólogo, da aluna cutucadora e do corno divulgador, eu sou contra qualquer punição ao namorado. Ninguém pode ter cerceado o seu legítimo direito a vingança.

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