O Futebol Brasileiro e o seu Complexo de Pit Bull

A noite do dia 04 de Maio de 2011 deveria ter ficado marcada na história do futebol brasileiro. Naquele dia, quatro equipes brasileiras foram eliminadas simultaneamente da Copa Libertadores da América, eliminadas em confrontos nos quais os times brasileiros eram considerados virtualmente classificados, devido a fragilidade dos seus adversários.

Quando o chaveamento das oitavas de final ficou definido, a opinião pública foi enfática em apontar a supremacia brasileira. O Cruzeiro eliminaria o fraco Once Caldas, o Fluminense passaria pelo Libertad, o Santos ganharia do América do México, enquanto que Grêmio e Internacional se responsabilizariam por patrolar Universidad Católica e Peñarol, para jogarem o gre-nal do século na fase seguinte.

Nas partidas de ida, Santos, Cruzeiro e Fluminense venceram e o Internacional conseguiu um bom empate fora de casa. Apenas o Grêmio desonrou o orgulho nacional ao ser derrotado no Olímpico. Na volta, o Santos jogou terça-feira e garantiu a classificação, reforçando nossa superioridade. Mas ai veio a famosa quarta-feira.

O Internacional jogou primeiro e abriu o placar logo no primeiro minuto da partida, encaminhando a fácil vitória. Todos ficaram surpresos quando o Peñarol virou o jogo em cinco minutos no segundo tempo. Os próprios jogadores do Inter pareceram não acreditar e não tiveram força para reagir. Depois, o Grêmio consolidou sua eliminação no Chile. O gre-nal do século não teria nem Grêmio, nem Internacional.

Ainda restavam Fluminense e Cruzeiro, em situação mais confortável. Mas o mundo ruiu sob seus pés, quando o Libertad conseguiu o gol da classificação aos 40 do segundo tempo e quando o Once Caldas conseguiu a improvável vitória por 2x0, eliminando o Cruzeiro de campanha impecável. O enorme favoritismo brasileiro se transformou na classificação de apenas uma solitária equipe paras as quartas de final.

Somada a derrota do Corinthians para o Tolima ainda na fase preliminar e o incrível Mazembaço do Internacional no ano anterior, a noite do dia 04 de maio de 2011 deveria ser a responsável por enterrar o complexo de Pit Bull do futebol brasileiro.

Nos anos 50, Nélson Rodrigues escrevia que o brasileiro sofria de um complexo de vira-latas. Diante de qualquer adversário de mais pedigree, nós já nos víamos derrotados e humilhados. A derrota contra equipes europeias estava decretada em nossas cabeças mesmo antes do começo da partida. Esse complexo só seria superado com a conquista do o tricampeonato mundial no México, em 1970.

O sucesso do futebol brasileiro a partir dos anos 90, com mais duas Copas do Mundo, títulos internacionais de clubes e inúmeros jogadores premiados como melhores do mundo, fez com que o brasileiro passasse a sofrer desse complexo de Pit Bull. Diante de qualquer adversário mais fraco, o menosprezamos e decretamos nossa vitória.

As derrotas nas Copas de 2006 e 2010 não tiraram a certeza da nossa superioridade. Perdemos por nossa culpa e não pelos méritos adversários. A noite de 04 de maio de 2011 também não ajudou, porque pouco depois o Santos conquistou aquela Libertadores. A equipe santista foi disputar o Mundial contra o Barcelona em clima de festa. “Vamos ver se eles são tão bons!”, “quero ver quem segura o Neymar, o Messi não é de nada”, diziam os entendidos da imprensa ufanista. Final: Barcelona 4x0.

Após o massacre de Yokohama, pela primeira vez os torcedores pararam para pensar no que estava ocorrendo, que humilhação era aquela. Só que logo depois o Corinthians levou a Libertadores e o Mundial de 2012, reacendendo o Pit Bull dentro de nós.

E eis que nesta semana, novamente nas oitavas da Libertadores, três times brasileiros foram eliminados juntos. Já perguntavam se o Palmeiras conseguiria ganhar do Atlético-MG. Pois, perdeu em casa para o Tijuana. Apontavam o fácil caminho do Grêmio até as semifinais. Foram interrompidos pelo colombiano Santa Fé. Afirmavam que o Corinthians deveria liquidar o confronto contra o Boca Jrs em plena Bombonera. Pois é.

Mesmo com esses reveses, comentaristas continuam apontando o amplo favoritismo brasileiro nas próximas fases. Temos mais elenco, temos mais dinheiro. Sim, se futebol fosse banco imobiliário, dificilmente os brasileiros perderiam os títulos. Mas, futebol é mais do que isso. Uma série de fatores entra em campo tornando qualquer resultado possível. Toda semana nós aprendemos isso.
De repente, seu goleiro comete a falha do século

No entanto, comentaristas do óbvio não irão mudar de opinião. E acabaremos todos sofrendo de um complexo de Pinscher, aquele que acha que é maior do que realmente é e não mete todo o medo que imagina.

Um sonho: ver esse texto sendo narrado por Fernando Vanucci.

Comentários