O Fim da Violência no Futebol


O resultado foi considerado ótimo. Dirigentes da Confederação Sul-americana de Futebol se reuniram para avaliar os resultados da punição imposta ao Corinthians após a morte de um adolescente boliviano dentro do estádio e foram unânimes. A punição conferida ao time brasileiro foi um sucesso. Ninguém morreu, ninguém se machucou, nenhuma ocorrência foi registrada dentro do estádio vazio.

A sensação de segurança era visível, mas o caso corintiano era um oásis de calmaria em meio a um deserto de violência. Enquanto isso, o pau seguia comendo solto no resto da América do Sul. Pedras atiradas na Colômbia, briga de torcida no Uruguai, quebra-quebra no Paraguai, tiroteio na Argentina. A situação beirava o caos.

As brilhantes mentes de La confederácion chegaram então a um novo consenso. Convocaram a imprensa e anunciaram com pompa e circunstância: todos os jogos da Libertadores 2013 seriam disputados com portões fechados. Um tanto quanto radical, mas serviria como um momento de reflexão em busca da paz no futebol. “Nadie más va a morir por el fútbol”.

Novo sucesso. Jogadores puderam cobrar escanteios em paz, a descida para os vestiários ocorreram com a maior tranquilidade e nenhuma ocorrência grave foi registrada em todo o continente. A medida também agradou as televisões. Os estádios vazios aumentaram a audiência das transmissões televisivas e possibilitaram um entendimento maior do jogo, com a chance de escutar as conversas. “Você dentro do gramado” foi o slogan adotado por uma emissora.

As autoridades públicas também gostaram. Sem público no estádio, não era preciso investir em transporte público e esquemas de segurança. Decidiram que a Libertadores 2014 também seria disputada para estádios vazios. Diversos campeonatos estaduais do Brasil adotaram a mesma medida, mesmo que ninguém tenha percebido a diferença. Os dirigentes brasileiros passaram a ser cobrados para que o Campeonato Brasileiro seguisse esse caminho e setores nacionalistas da imprensa bradavam que a América do Sul estava anos a frente da Europa na gestão de eventos esportivos.

Tudo parecia estar perfeito até que as brigas começaram a se intensificar nos bares, nas estações de metrô e mesmo em pontos de ônibus. Bastava que dois grupos organizados se encontrassem para que a carnificina começasse. Os dirigentes esportivos lavaram as mãos, dizendo que se responsabilizam apenas pelo o que acontecia nos estádios e para eles, nenhum problema estava sendo registrado.

As autoridades brasileiras logo tomaram uma decisão polêmica e decretaram toque de recolher durante as noites dos jogos.

Em um primeiro momento as brigas diminuíram mas logo os conflitos começaram a acontecer em cidades que não recebiam os jogos e o toque de recolher foi estendido para todos os municípios brasileiros. Um pequeno problema, visto que partidas são realizadas todos os dias da semana.

Decidiu-se então que os jogos de futebol não mais seriam transmitidos e que o resultado dos campeonatos seria anunciado apenas no seu final. Além de contribuir para esquemas criminosos de manipulação de resultado, o dia do anúncio ficou marcado por uma briga histórica e generalizada em diversas cidades brasileiras.

Acuados, os governantes resolveram proibir a prática do futebol no território nacional. Alguém ainda argumentou se não seria mais fácil simplesmente prender as pessoas que provocam distúrbios no futebol e julgá-las de acordo com a lei. A hipótese não foi considerada.

O fim do futebol trouxe sérios problemas. A televisão perdeu patrocinadores, os patrocinadores perderam clientes e a economia recuou. Os milhares de jogadores de futebol desempregados trouxeram inúmeros problemas sociais. As opções de lazer também diminuíram. Revoltados com a falta de lazer e com a miséria, a população começou a se organizar em gangues que cometiam delitos e justiçamentos em praça pública.

Mas os dirigentes estavam felizes. Afinal, ninguém mais morria pelo futebol.

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