Louquinho de Bairro

O louquinho de bairro é uma figura muito comentada neste blog e uma das personalidades mais fascinantes de nossa sociedade. Há muito tempo que o CH3 menciona o assunto levemente e creio que esta é a hora de fazer uma abordagem mais profunda sobre o assunto.

Eu me dei conta da existência dos louquinhos de bairro há não muito tempo atrás. O ano era 2009 e eu estava na sala/redação de um jornal no bairro Boa Esperança, que ficava atrás de um bar. Era um mês de inverno, apesar de não estar fazendo frio em Cuiabá, para variar. No entanto, um senhor no bar garantia que o frio estava chegando. Dizia ele: “amanhã vai fazer 8 graus em Cuiabá. Escutem o que eu estou dizendo. Vocês não levam minhas previsões a sério, mas eu nunca erro”.

Sua frase continha um ar ameaçador, porém inofensivo. Ele não fala aquilo como se fosse uma previsão baseada em informações que pesquisou, um palpite. Sua fala era simplesmente a verdade, ele simplesmente sabia que o frio estava chegando. Ele era um apocalíptico que não causava medo. Um tipo de louquinho de bairro.

O Jovem Coringuinha
O louquinho de bairro se difere de outros loucos, por conta deste sentimento de proximidade que o transforma em um patrimônio local. Ele não é um louco de cidade turística, um louco de praia que mais parece um charlatão querendo o dinheiro dos turistas que se impressionam com qualquer coisa. Não é um ameaçador louco de centro de cidade.

Ele é um ingênuo, o nosso louquinho. Há uma autenticidade no que ele faz. Ele é do bairro e todos o conhecem. Se o louquinho do Boa fosse fazer suas previsões em um bar do Baú, ele certamente levaria porrada. Sua existência não é exclusividade de nenhum lugar. Todo bairro que queira existir como tal, deve ter um.

Certa vez eu estava no bairro da Saúde em São Paulo e passei por uma mulher em uma violenta discussão verbal com o ar. Ninguém parecia se importar, ninguém parecia estranhar. Se alguém mexesse com ela, é provável que os comerciantes do bairro se revoltassem. Não mexa com os louquinhos dos outros.

Já escutei relatos de louquinhos nos mais diversos municípios, com as mais diversas especialidades. Eles contam canudos, fazem desenhos na parede e conhecem a vida de seus bairros. Os louquinhos de bairro tem uma importância fundamental na história da humanidade. Eles perpetuam mitos, eles fazem arte. Quem você acha que inventou a história do Curupira? O que vocês acham que Salvador Dali era em sua juventude?

Nos tempos modernos, o louquinho de bairro tem sua existência ameaçada. Nesta sociedade violenta, as pessoas sentem medo de qualquer cidadão com comportamento fora do padrão. Os pais falam para seus filhos: não cheguem perto daquela casa, porque o homem que mora lá é louco. As crianças, vocês sabem, sentem atração pelo proibido e vão até perto da casa. Como sabem que quem mora lá é um louco, elas provocam. Pulam o muro, mijam na parede, gritam palavras de ordem. Um dia o louquinho perde o controle e acaba matando as crianças. Ele então é tratado como um monstro e nas melhor das hipóteses vai parar em um manicômio recebendo eletrochoques. Na pior, é estuprado e morto em alguma cadeia.

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