Cadeia Instantânea

Algumas situações da vida são tão ruins, que só podem acontecer devido a uma conjunção de fatores. E nem falo da queda de um avião, de um atropelamento, um título do Flamengo ou outra tragédia de grandes proporções. Falo de pequenas situações do cotidiano que só aconteceram porque várias coisas deram errado. Porque várias pessoas falharam em suas tarefas. Não viram que uma situação aparentemente insignificante poderia se transformar em uma cadeia de erros. É o caso deste vídeo.



O Bar Mitzvá é uma celebração judaica, que, mal comparando, se equivale a nossa festa de debutantes. Quando o adolescente completa 13 anos, ele passa a ser legalmente responsável pelos seus atos, de acordo com a lei judia. Felizes com a situação, os pais resolvem celebrar.

Os pais de Nissim Ourfali resolveram fazer um vídeo para o seu Bar Mitzvá. Ao que se saiba, ele não é o inventor do macarrão instantâneo. Mas, bem que poderia ser. Depois de protagonizar esse vídeo, o jovem Nissim seria merecedor de qualquer glória possível, qualquer coisa que pudesse amenizar o seu sofrimento perante a humanidade. Sofrimento, que surgiu da tal cadeia de erros citada no começo do texto.

Primeiro, alguém teve essa idéia. Imagino que foram os pais. Talvez tenha sido o próprio garoto, mas não acredito que alguém faria isso contra si próprio. O refrão que diz “e os meus pais são demais” reforça essa teoria, até porque, o patriarca parece ser o mais empolgado com a situação. Colocar seu filho numa vibe boy band de menininha te parece legal? Para eles, pareceu.

O próprio garoto poderia ter se recusado a participar do vídeo? Poderia. Mas, creio que seja difícil para um garoto de 13 anos tomar essa decisão. Os pais devem ter argumentado que não seria nada demais e que eles ficariam muito felizes se o filho participasse. Era um momento importante para eles, nós pagamos sua mesada e tudo mais.

Depois vem o lado da produtora. Imaginem o quão desgraçante é você ganhar dinheiro com isso. Imaginem o que é escrever uma letra como essa. Eu, se tivesse um trabalho desse, já teria pensado em meter uma bala na cabeça algumas vezes. “Bem, hoje eu vou fazer uma letra sobre uma festa de debutantes em cima da melodia de Fugidinha. Cadê o revólver?”. O lado positivo é que depois você pode mandar seu currículo para o Casseta & Planeta, para tentar uma vaga de compositor de paródias.

Tarantino e Nissim em: Willy, a baleia assassina
Um trabalho tão estressante não poderia gerar material de boa qualidade. Durante séculos, os filósofos discutirão o que é ir para a baleia. Os tecnólogos discutirão porque colocaram o jovem Nissim sobre uma baleia durante essa parte da música. Enfim, Paul McCartney e Quentin Tarantino não fariam um trabalho melhor.

Mas agora vem o pior. O vídeo seria reproduzido apenas durante a celebração. Seria um momento íntimo de familiares e amigos, que um dia ainda iriam rir muito disso tudo. Seria um segredo entre eles, que obrigaria o Nissim a ser amigo de todo mundo, sob o risco de que isso vazasse um dia. Mas, alguém resolveu colocar no Youtube. E aí começa a desgraça.

Porque colocaram esse vídeo no Youtube? Ninguém pensou na merda que isso poderia resultar? Logo a brincadeira do Bar Mitzvá se transformou em uma bomba de proporções inimagináveis. Um constrangimento público irreversível. E a responsabilidade caíra toda sobre o Nissim. Porque, afinal, ele fez 13 anos.

Imaginem como será a vida deste rapaz de agora em diante? Como foi o seu primeiro dia no colégio. O primeiro Day After. Como está sendo acordar de manhã com aquela sensação de que um novo dia, uma nova guerra começa. Não vai adiantar mudar ele de colégio. Nem de cidade, quiçá de país. Acho que quando ele tiver 20 anos e for tentar seu primeiro emprego, o patrão irá olhar: “Nissim Ourfali? E aí, como que vai a baleia?”.

Uma triste história, uma tragédia que poderia ser evitada em várias etapas. Mas, não foi. E agora o que resta é chorar.

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