Sobre torcer e torcer contra

Não sei dizer qual foi o momento exato, mas em certo ponto ficou muito claro que o Corinthians iria ganhar a Libertadores em 2012. Talvez tenha sido no gol de Paulinho, no último lance do jogo contra o Vasco. Depois de Diego Souza ter desperdiçado a única chance de gol em 180 minutos do duelo, aquele gol de Paulinho mostrou que, além de um time bom e focado, jogadores decisivos e tranquilos, torcida participante, mostrou que o time estava ungido. E não se ganha uma Libertadores sem estar iluminado.

Claro que o avanço corintiano rumo a glória provocou reações adversas. Como é de costume, aqueles que não torcem para o time, torcem contra. Essa é a lógica do futebol. Você tem o seu time de futebol e torce para que ele ganhe todos os campeonatos possíveis todos os anos. E, naturalmente, torce contra todos os outros. Para que eles sofram derrotas humilhantes, dia após dia, desgraçando todos seus torcedores. Como isso, infelizmente, não é possível, você opta por uma redução de danos.

Qual era a expectativa sobre o título do Corinthians? Que sua timeline seria infestada de mensagens melosas sobre o orgulho de ser corintiano. Que os jornais do dia seguinte fariam matérias de 30 minutos sobre o título corintiano. Tino Marcos faria um texto comparando algum jogador com um maestro e a torcida com uma orquestra. Seria o apocalipse. Agora, e se o Boca tivesse ganho? Não aconteceria nada. E se fosse o Atlético-MG? Nada. Você torce para aquele que fará menos mal. E sob esse ponto de vista, o Corinthians é sim o time mais odiado do Brasil, ao lado do Flamengo.

Infelizmente, alguns corintianos não entendem assim. Tudo porque o Corinthians é a equipe mais paparicada pela grande imprensa nacional. Os corintianos dirão e Tiago Leifert, argumentará, que é uma questão de mercado. E, de fato, é. O Corinthians tem a maior torcida do principal mercado consumidor do Brasil e é natural que tenha mais jogos transmitidos. Mas, isso não justifica que os canais de televisão contratem ídolos corintianos para comentar futebol, sem falar nada com nada, apenas por serem corintianos.

Além disso, a mídia estimula o "marketing do sofrimento". O Corinthians se orgulha dos seus piores momentos. A maior festa da equipe foi a conquista do Campeonato Paulista em 1977, após 23 anos de jejum. O título da segunda divisão foi mais comemorado que o título brasileiro. Corintianos adoram "redenção", se definir como nação. Todas suas conquistas ganham contornos de drama, mesmo que seja em um jogo frio como a final do Boca.

Geralmente, a transmissão televisiva mostra a torcida vez ou outra. Em jogos do Corinthians, cada lance é pontuado por uma imagem da arquibancada. Alguma imagem de sofrimento, que passa a sensação de que o corintiano é o único que sofre e torce. O único. Corintiano se acha assim. A torcida se convenceu disso e passou a tratar quem seca o Corinthians em jogos decisivos como "antis". Em um surto megalômano, eles acreditam que todos os outros torcedores do planeta vivem apenas para torcer contra a equipe de Parque São Jorge.

Confesso que eu também já teria desistido de ler esse texto

Mas não é assim. No já citado jogo contra o Vasco, vocês acham que os Flamenguistas torceram contra o Corinthians? Torceram contra o Vasco é lógico. Para que o Vasco fosse massacrado. Isso é o futebol. Quando o São Paulo enfrentou o Liverpool em 2005, todo mundo secou o São Paulo. Nos anos em que o time foi tricampeão brasileiro, isso também aconteceu. Porque? Porque para os outros, naquele momentos os danos seriam menores com a conquista de outro time. Eles não teriam que aturar a empáfia da torcida do São Paulo, falando da estrutura que ganha títulos sozinha.

De tão convencidos, os corintianos começaram a falar que conseguiram a proeza de fazer brasileiros torcer pela Argentina. Como se eles próprios não tivessem feito isso em 2000. Falaram que isso demonstrava a falta de caráter. Claro, não é preciso dizer que quem diz isso não deve acompanhar futebol. Só sendo muito alienado para acreditar que um palmeirense torceria para seu principal rival, resumindo quase um século de rivalidade em um ódio fake de Brasil x Argentina. No futebol o clubismo é muito maior do que nacionalismo, oras. Além disso, os pobres argentinos não são maníacos estupradores de criancinhas e mutiladores de velhinhos. Quem torce para um time brasileiro, por ser brasileiro, só pode ser classificado como anormal.

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