"Eu Vou Fazer O Meu Trabalho"

O Brasil, como todos já sabem, é a pátria do UFC. A ascensão da Luta Livre a esporte nacional foi rápida e furiosa. Quando as pessoas comuns perceberam, já não podiam mais escapar de um mundo em que o público vibra ao ver dois homens de sunga abraçados no chão em posição papai-mamãe.

Pois, foi neste mundo em que um duelo entre o semideus Anderson Silva e um americano de nome estranho ganhou ares de luta do século. Um embate entre o terceiro e o primeiro mundo, entre o imperialismo estadunidense e os oprimidos latinos-americanos. Foi quase um duelo entre Ivan Drago e Rocky Balboa. Silva virou um Simon Bolívar pós-moderno.

Como sempre, o duelo foi cercado de provocações. Faz parte do espetáculo que os dois lutadores fiquem se encarando antes da luta, que façam provocações das mais variadas. Tudo na chamada guerra psicológica, numa tentativa de desestabilizar a mente do adversário. Mas, na verdade é só marketing, para que o público espectador acredite que, nossa, de fato os oponentes se odeiam, eles irão lutar até a morte se for preciso, porque eles não tolerariam ver o outro vitorioso.

Foi nesse contexto, que o ícone Anderson Silva disse que iria bater em seu adversário. A frase foi destacada por todos os portais da internet, se popularizou no Twitter. Creio que "eu vou bater nele" substituiu a eterna "amar é jamais ter que pedir perdão" nas camisetas que nós vemos na rua.

Oras, bater no adversário é o grande, senão o único, objetivo de uma luta livre. Por mais que, para alcançar este objetivo, os lutadores fiquem de sunga na posição do frango assado, acreditamos que eles só querem se bater. Se eles quisessem outras coisas, seria mais fácil passar um telefonema no final da luta. Afirmar que vai bater no adversário não é nada de mais. É só o que se espera dele, nada mais do que isso.

Shun odeia a violência
Queriam que ele falasse o que? Que "iria apanhar muito do seu adversário" ou que iria tentar fugir ao máximo da luta, porque ele odeia violência. Estranho seria se o A. Silva falasse que iria estuprar o adversário. Ou que iria meter dois gols nele. Ou que iria cruzar a linha de chegada primeiro. Ou que iria convidá-lo para um jantar mexicano a luz de velas, ensiná-lo a dançar um bom bolero e terminarem a noite entregues ao desejo carnal.

Na era do politicamente correto, as pessoas não podem mais falar que pretendem cumprir seus objetivos. Se um jogador de futebol fala que vai meter um gol no adversário, seus oponentes se sentem ofendidos. Dizem que foram desrespeitados, que o futebol é dentro de campo e que iriam dar a resposta dentro do gramado. Se um jogador de basquete fala que irá fazer uma cesta de três pontos, a torcida adversária já irá preparar as vaias e as pedras para o falastrão.

Preparamos frases polêmicas ditas durantes a história.

"Eu vou criar o mundo em seis dias e descansarei no sétimo". Polêmico, Deus afirma que pretender criar um planeta.

"Eu vim, vi e venci". Júlio César, imperador de Roma em um momento egocêntrico.

"Nós vamos vencer a Segunda Guerra Mundial". Wiston Churchill ignorando o poderio nazifacista e cantando vitória antes da hora.

"Eu vou pisar na lua". Neil Armstrong subestima os poderes do espaço, acreditando que chegará a lua.

"Eu vou sempre amar você". Whitney Houston, esquecendo-se que nada é para sempre. Um dia as pessoas morrem.

"Eu vou colocar os meninos para jogar bola e as meninas para jogar vôlei". Professor de Educação Física, ciente de que sua profissão não permite muitas possibilidades. Mas, vá saber?

Talvez, se Anderson Silva tivesse adotado a postura clebermachadiano e tivesse dito "Talves eu bata nele, talvez não. Um de nós pode morrer, assim como os dois poderemos ainda rir muito disso tudo, quem sabe o futuro?", ele não teria parado nos jornais. Mas, o fato é que ela não deveria. É absurdamente idiota dar destaque para uma coisa óbvia.

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