6 anos, 7 posts (II)

Bati na porta de Pai Jorginho de Ogum. Fui atendido pelo próprio, que me perguntou o que é que eu fazia ali. Disse que vim apenas conversar. O velho mago abriu a porta, meio receoso, mas eu o acalmei, dizendo que aquilo não era um filme. Jorginho sempre gosta de falar essas frases prontas. Eu já me acostumei.

Jorginho disse que eu andava sumido, não neguei. Disse que se preciso fosse eu assumiria minha omissão. Ele me disse que tudo bem e falou que eu ainda aparecia às vezes, pelo menos. Disse-me que pior eram o Vinícius e o Tackleberry, que ele não via há tempos, desde que um deles fugiu para as Bahamas. Respondi para ele que era normal, que eu também não os via há algum tempo. Jorginho me perguntou se eu tinha notícias.

Falei que encontrei Tackleberry recentemente em um jantar. Disse que seu aspecto físico continua o mesmo, com o nariz abaixo dos dois olhos e acima da boca. O pescoço continua sob a cabeça, suas orelhas continuam no lugar. Não notei nenhuma mutilação e apesar de só ter lhe visto sentado, acredito que ele não esteja paraplégico.

Disse que encontrei Vinícius algumas vezes, fazendo compras no Big Lar. Ele comprava produtos de limpeza. Pai Jorginho disse que isso era uma péssima notícia, significava que Gressana agora era um homem sério, capaz de cuidar de uma casa. Pensamos onde é que estava aquele velho Vinícius que subia nos telhados e pregava a besuntação acima de tudo. Os devaneios sobre a juventude perdida foram interrompidos por Marcão.

O velho homem chegou a recepção da Carnicentas com seu ar de cansaço e sabedoria, que o tornam uma espécie de Morgan Freeman cuiabano. Marcão disse que era uma boa notícia que Gressana estivesse comprando produtos de limpeza. Falou que pior seria se ele estivesse comprando produtos orgânicos e integrais, ou queijos importados, cremes para a pele. "Pelo menos ele num virô viado. Melhó sê responsável do que viado", concluiu Marcão.

Aproveitei a presença de Marcão e perguntei se ele estava bem. Ele disse que sim. Eu falei beleza. Pensei se era hora de levantar e ir embora para evitar o silêncio constrangedor. Antes, perguntei onde é que estavam os outros, queria me atualizar. Alfredo Chagas, disseram, está trabalhando em campanhas políticas no interior do Estado. Hanz, o Pansexual foi para o Pan de Guadelajara e desde então volta do México no lombo de uma lhama. Uma infeliz lhama, se vocês me entendem. As últimas informações dizem que ele já está no Panamá.

Perguntaram de Guilerme e eu falei que ele estava no meu quarto. Mas, que infelizmente, um braço seu havia caído, ele precisa de uma reforma. Jorginho me disse para bolar um grau de fundi para realizar a reforma. Me espantei com seu vocabulário. Perguntei então do Cão Leproso. Claro, o mais importante de todos.

Jorginho me olhou cabisbaixo. Contou que certo dia, Cão Leproso estava na rua, distraído, quando um carro passou. Meu coração parou, esperando pelo pior. Cão Leproso foi atropelado, disse. Por um segundo, o mundo parou ao meu redor. Lembrei-me das tardes em que andávamos nos parques, com o Cão Leproso correndo feliz em meio ao matagal, coçando as costas no gramado, mijando nos pneus do meu carro. Pensei em tudo o que este cão já havia proporcionado ao blog, nossa viagem até Alto Caparaó em um Gurgel, buscando Jorginho de Ogum. Pensei em como eu daria a notícia aos fãs. Pensei que era o fim do CH3.

Estava quase chorando, quando Jorginho me tranquilizou. Disse que, como o Cão Leproso é um desenho animado, ele apenas viu umas estrelas, colocou umas bandagens na cabeça e ficou bem. Então, o cachorro sem braços entrou pela porta. Dei-lhe um abraço. Ele ficou com aquela cara de sempre. Eu pensei que, caramba, a lepra é contagiosa. Pensei que, faz tempo que ele não perde mais nenhuma parte do corpo, talvez esteja curado.

Avisei a todos que Alfredo Humoyhuessos estava em um estudo sobre como as convenções sobre sustentabilidade são influenciadas pelas partidas da Eurocopa. Conclui que todos estavam bem. Jorginho fez um aparte. Perguntou sobre o Garoto Fabinho, aquele infeliz. Lembrei que o garoto já deveria estar com 12 anos a essa altura. Desde o começo de 2010 que nós não tínhamos notícias sobre ele. Seu pai o havia mandado com apenas 20 reais no bolso para Gaúcha do Norte. Falei a Pai Jorginho que eu iria tentar descobrir seu paradeiro.

O pai-de-santo então me perguntou se eu queria uma previsão. Hesitei. Ele disse que era de graça. Falei que tudo bem, já que eu já estava ali. Ele então me disse que o Corinthians será campeão da Libertadores. Falei para ele que isso seria uma desgraça. Ele me disse:
Eu sou marcado pela insígnia da desgraça. Na minha vida eu já vi assassinatos, estupros, esquartejamentos, briga na torcida do Flamengo. Já vi tudo o que de ruim pode acontecer, já vivi as piores experiências que qualquer ser que se rasteja por esse maldito solo pode viver. Mas nunca vi uma Libertadores do Corinthians. Eu sei que esta desgraça vai ocorrer enquanto eu ainda estiver vivo. E eu sei que não viverei muito.
Mandei-o a merda.

O CH3 em 2008
(Continua...)

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