Deixe seu recado após o sinal

Vez por outra, surge algum novo objeto em nosso cotidiano que carrega em si o paradigma da modernidade. Um objeto que deixa sua simples condição e assume toda uma simbologia. É o caso da agenda eletrônica. Em 1996, a agenda eletrônica era o melhor presente que você poderia dar para alguém. Mais do que um aparelho funcional, você fornecia um mundo novo. Com uma agenda eletrônica, você finalmente deixaria para trás o mundo das trevas. Era como aprender a andar novamente.

Era assim também com os aparelhos de fax. Quando ele foi inventado, creio que os seus inventores se abraçaram com os olhos marejados. Colocaram Cidra em taças de cristal e brindaram a maior invenção da humanidade, invenção que jamais seria igualada.

Mas, eles sumiram repentinamente. Por mais que aparelhos de fax ainda sejam utilizados – sim, acredite – tanto o fax, quanto a agenda eletrônica, não marcaram seus nomes na história da humanidade. O advento do celular e da internet eclipsou as duas invenções, antes que elas pudessem ter dominado o nosso cotidiano. No futuro, ninguém se lembrará do fax, igual nós nos lembramos do telefone.

E ai, eu falo sobre a secretária eletrônica. Uma invenção dos anos 80, que por tempos significou o domínio do homem sobre a natureza. Você ligava para alguém e, se este certo alguém não estava em casa, ou não queria atender o telefone, você poderia deixar uma mensagem na secretária eletrônica. Quantos filmes não têm a clássica cena do homem chegando e casa e conferindo a secretária eletrônica, em busca de alguma mensagem nova? Conferir a secretária eletrônica era o equivalente ao nosso checar o Twitter.

A ideia da secretária eletrônica ainda existe. Sim, quando você telefona para algum celular e o infeliz não atende, você tem a possibilidade de deixar uma mensagem de voz. Mas, convenhamos. A literatura universal desconhece qualquer caso de pessoas que deixem mensagens de voz nesses casos. A polícia federal jamais registrou uma situação em que alguém tenha escutado alguma mensagem deixada. Até porque, escutar uma mensagem de voz consiste em uma missão impossível.

Mas, nos áureos tempos da secretária eletrônica, não existia essa frieza robótica. Creio que a grande graça do aparelho e o que faz com que ela seja mais lembrada que a agenda eletrônica, são as mensagens que o proprietário do aparelho deixava.
- Oi, você ligou para o Émerson. No momento eu não estou em casa, mas você pode deixar o seu recado.

Essa era a maneira mais formal de comunicar a ausência. O nervosismo com a gravação, fazia com que sua voz soasse igual ao robô do número certo. Mas muitas pessoas optavam pela descontração.
- Oi, você ligou para o Dani…
- … Para o Joey…
- E para a Cris!
(Todos em coro: eeeeeeeeee)
- No momento, nós não estamos em casa.
- Au, au
- Opa, o Tommy está
- hahahah
- Mas, como ele não atende o telefone, deixe o seu recado que nós vamos retornar.
- Tchau!
- Yeeee.

Eram grandes momentos colaborativos em família. Imagino que o patriarca reunia seus filhos em volta da mesa de jantar e eles planejavam o roteiro da mensagem da secretária. Só jantariam depois que a mensagem estivesse gravada. O bom-humor era fundamental. Ter uma mensagem de secretária eletrônica séria, faria você se transformar em um loser, vítima preferencial de bullying. Era melhor não ter.
- E ai, você deu um toque pro Deivid. Se liga na parada, no momento eu não estou, mas pode rolar o papo ai que eu devolvo, morô? Fui!

É isso que faz com que a secretária eletrônica esteja acima do fax, por exemplo. Ela fez parte das nossas vidas mais intensamente – mesmo quem não dispunha do aparelho, já telefonou para pessoas que tinham – e traz uma lembrança. Aquela lembrança no meio termo entre a nostalgia e a vergonha. Algo parecido com as pochetes e Dirty Dancing.

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