Chupem!


Padre Lanza desceu do carro revoltado. Estava tão ferozmente exaltado que as pessoas a sua volta começaram a chorar em posição fetal. Da sua boca escorria a baba espessa e bovina dos possessos. Tudo por que alguém havia encostado na maçaneta do seu carro. Algo tão sério, que o único paralelo possível seria a maçã comida por Adão e Eva. Infelizmente, a fábula do fruto proibido é ficcional, portanto, nunca existiu nada mais grave do que encostar no carro do Padre.

Ele então perguntou quem havia feito aquilo. E resolveu ter um papo de 20 anos com o criminoso. O papo não cumpriu o tempo esperado e durou menos de 10 segundos. Não se sabe o que eles conversaram. Talvez, realmente seja melhor não saber. Ainda voltando para o seu sacrossanto carro, Lanza diz “Chupa o meu cu”.

Pare para pensar. Provavelmente, em sua vida inteira, você jamais escutou uma ofensa menos heterossexual do que esta. Dizem que os palavrões virilizam uma conversa, este não é o caso. Se você está numa discussão e alguém lhe diz “chupe o meu cu”, o que você sentiria? Desde, é claro, que você não seja um grego. Você ficaria mais constrangido do que ofendido. E o ofensor? O que raios ele quer querendo que alguém chupe o toba dele?

A tentativa fracassada de Pernambuco Lanza em ofender alguém é o reflexo de um tempo. Sim, de uma era. As ofendas mudam com o passar do tempo. Houve uma época que nada era pior do que chamar alguém de excomungado. Ou de herege. Ou mandar alguém para o diabo que o carregue. Na época em que a peste negra dizimava a Europa, chamar alguém de peste era uma ofensa tremenda.

Nesta mesma época, mandar alguém tomar no cu deveria ser insólito. “Meu amigo, como assim? Vou tomar o que?”. Banana, ovelha, Roberta, panaca, déspota, disgramado, Bacuri, tampinha, filho da puta, Economista Europeu, engolidor de caralhos, viadasso ou fonema foram ofensas mortais.

Atualmente, nada é pior do que mandar alguém chupar, vai saber o que. Um limão, uma manga, uma uva, um pau, um cu. O fato é que a qualquer momento você vê as pessoas gritando “Chupa”, nas ruas chuvosas, casas no campo de sapê e demais lugares.

Chupem!
Quando um time de futebol ganha uma partida, você vê os ganhadores gritando “Chupem!”. E não, eles não mandam os perdedores chuparem. Eles mandam qualquer cidadão no mundo chupar. Torcedores de times que nem participaram dos jogos, pessoas que estavam dormindo. Todos devem abaixar a cabeça e chupar o vencedor.

Quando alguém passa no vestibular, a pessoa saí por aí gritando “Chupem”. Quem deveria chupar? Boa pergunta. Quando alguém estaciona o carro em uma vaga apertada, desce do carro vibrando e gritando “Chupem, Manés!”. Quando alguém amarra os cadarços corretamente, logo manda um “Chupem”.

No fundo, imagino que quem deva chupar seja a sociedade. Que sempre duvidou do enorme potencial do cidadão. Diante da pressão de não conseguir fazer o nó da gravata, e da superação da tarefa, o cidadão logo diz “Chupem! Chupem todos vocês que achavam que eu jamais iria conseguir”. É um misto de egocentrismo megalômano.

Assim sendo, Pe Lanza é apenas um reflexo de seu tempo, tempo que ele simboliza. O que significa que é uma merda de época. Chupem, otimistas.

Comentários