Recall

Acho que foi lá no final dos anos 1990. Letras brancas começavam a subir por uma tela azul e ao fundo, uma voz solene lia o anúncio. “Atenção proprietários de veículos da marca Toba, modelo Tobamóvel fabricados no ano de 1999. Informamos que os modelos com os números de chassi entre JAHSK19201 e JKWOP19023 vieram com um defeito no parafuso do banco do passageiro. Os proprietários destes veículos deverão comparecer até uma concessionária para fazer a troca da peça defeituosa sem nenhum custo adicional”.

Foi a partir daí que começou a era do Recall. Nos meses seguintes, não sei por que razões, diversas marcas de automóveis começaram a chamar seus clientes para resolver os mais diversos problemas de fábrica. O tapete do modelo tal poderia se prender no acelerador, a tampa do motor vibrava muito, a maçaneta interna se soltava sozinha, tudo era motivo para recall.

Produtos alimentícios começaram a passar por voltas as fábricas também. “Ao contrário do que está informado na capa dos salgadinhos do lote LA8129, este alimento contém glúten sim”. Ou então, que “por um erro de fabricação, a tampa do vidro de palmito não abre. Aliás, jamais abriu” ou “por um erro no elemento químico utilizado, a lata de sardinha poderá decepar o seu dedo”.

O recall virou uma espécie de marketing. As empresas o utilizavam para mostrar como elas tinham responsabilidade com os seus clientes. Mas, eu sempre pensei pelo outro lado. E quem já sofreu com isso? Quem perdeu uma perna por conta do parafuso solto? Ou quem perdeu parentes por conta do maldito glúten, com seu N no final, que teima em contrariar nossas professoras de alfabetização. E como é o recall de um salgadinho? Você leva o pacote vazio e um exame de fezes que comprove a sua ingestão?

No final de 2011, foi a vez de uma fábrica de preservativos chamar de volta a fábrica uma de seus lotes. O produto tinha um defeito, que poderia explodi-lo. O conselho é que as pessoas não utilizassem o item defeituoso. O problema, é que os preservativos não são produtos armazenados por muito tempo, ou que serão utilizados diversas vezes.

Como é feito esse recall? O indivíduo leva o seu filho para a empresa cuidar? O fabricante irá bancar o coquete anti-HIV?
- Olha, eu utilizei uma camisinha que veio com defeito de fabricação.
- Não se preocupe senhor, nós garantimos um novo produto ou o seu dinheiro de volta!
- Isso… não… muda… nada…

Consultamos o nosso especialista em aviação e pesquisador enciclopédico colombiano, Alfredo Humoyhuessos que resgatou alguns recalls exóticos da história da humanidade.

“Informamos aos clientes que compraram um veículo da marca Spider, que, devido a um problema no processo de seleção dos nossos funcionários, os automóveis fabricados no ano de 2009 vieram sem disco de freio. Em seu lugar, foi instalado um disco do Michel Teló. Assim sendo, é bastante improvável que o veículo consiga reduzir a sua velocidade até parar”.

“Atenção senhores clientes, que compraram os salgadinhos Chips do lote 98BN. Devido a um erro da máquina, estes salgadinhos não foram temperados com Sal e sim com estricnina”.

“Caros amigos, clientes, que compraram videogames da marca Polystation em dezembro de 2004. Graças a um erro de nossos fornecedores, o aparelho não veio equipado com controles remotos, mas sim, com minas terrestres. Compareçam as nossas autorizadas com o equipamento e nota fiscal, para efetuar a troca do produto”.

“Atenção usuários dos pára-quedas flecha. Devido a um erro na fabricação dos nossos produtos, ao se puxar a cordinha o pára-quedas não se abre. Ao invés disso, uma stripper sai de dentro de um bolo. Nossos pêsames a todos os envolvidos”.

Por algum motivo estranho, nenhum dos usuários prejudicados por estes serviços equivocados chegou a requerer o reparo necessário.

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