Devolução de dinheiro em caso de insatisfação

O ponteiro do relógio marcava 10h40 de uma terça-feira, um dia nublado. Dona Sônia está insatisfeita. O produto que ela comprou não funcionou da maneira como ela esperava. Sentada em frente à televisão, ela se depara com o comercial do produto. Depois de uma explicação sobre os seus efeitos, desdenhados por Sônia, o narrador anuncia: “Garantimos a sua satisfação, ou o seu dinheiro de volta”.

Dona Sônia percebeu um estalo e o seu sofá quebrou. Recuperada do tombo, ela decidiu tomar as providências necessárias. Pensou “é verdade, eles garantiram minha satisfação ou o meu dinheiro”. Procurou a embalagem do produto, encontrou o telefone do SAC e discou os números.
- Atendimento ao cliente, boa tarde.
- Boa tarde – Sônia pensou porque a atendente disse boa-tarde, se ainda não havia passado do meio-dia. Pensou que era o fuso-horário.
- Pois não senhora.
- Bem, eu assisti a propaganda do produto e… comprei-o, porque se adequava ao meu caso. Mas, ele não fez o efeito.
- Azar o seu senhora, digo, acontece, que pena.
- Mas, na propaganda vocês garantiram que funcionaria, caso o contrário, o meu dinheiro seria devolvido!

Escutou-se o barulho de um raio. As fortes chuvas de verão derrubaram a ligação. Em um contato posterior, Sônia foi indicada a procurar a sede da empresa, em Taubaté e procurar o Departamento de Devolução de Dinheiro para Clientes Insatisfeitos. Comprovada a ineficiência do produto, o dinheiro seria devolvido.

Dona Sônia começou a pensar no que poderia fazer. Afinal, seria fácil comprovar que o Total Abdominator da Polishop não havia feito efeito. Ou, que mesmo o Omo quádrupla ação havia se provado ineficiente. Bastaria olhar a barriga do cliente ou a roupa ainda suja. No máximo, a empresa iria colocar a camisa num mega-tubo e de onde ela sairia branca. Haveria alguma satisfação.

Mas o seu caso era diferente. Uma das 13 milhões de pessoas no Brasil que sofrem de prisão-de-ventre, Sônia assistiu a propaganda do Activia. Emocionada com os depoimentos libertadores dos usuários do produto, ela resolveu experimentar. Para sua frustração, os problemas continuaram, mesmo realizando o desafio proposto pela marca. O problema é: como ela provaria que o produto não surtiu o efeito necessário? O fracasso do produto não era palpável, felizmente.

Essas dúvidas consumiram a cabeça de Sônia na longa viagem até Taubaté. Por vezes, ela pensou em desistir, mas o ônibus não poderia deixá-la na estrada. Finalmente ela chegou até o DDDCI.
- Oi, bom dia.
- Boa tarde.
- É... que queria meu dinheiro de volta, porque o seu produto não fez efeito.
- Qual produto, senhora?
- Activia.
- Ok. Você tem como provar que o produto não fez efeito?
- Bem... aqui estão as embalagens vazias...
- Prove que você usou.
- Bem...
- Prove que ele não fez efeito!
- Bem, eu continuo sem ir no banheiro! Faz quinze dias!
- Prove!
- Como?
- Prove!

O que eles queriam? Um exame que comprovasse a prisão de ventre? Análise do estomago, para provar que o Activia havia sido consumido? Um teste de carbono 12 em regiões chatas? Constrangida, dona Sônia foi embora. Mas, seu coração continuava com ódio, com o peso da injustiça. A única alternativa seria buscar a Justiça. E, assim ela fez.

Entrou com um processo por propaganda enganosa. O juiz que analisou o documento, reagiu negativamente.
- Hhaahahahhahaahm propaganda enganosa! Hahahaha! Você já viu uma propaganda que diz a verdade? Cai fora minha filha, tenho muito o que fazer hoje!

Orientada pelos advogados, dona Sônia pediu um ressarcimento por danos morais. Queria aliviar o constrangimento de ser obrigada a provar que sofreria de prisão de ventre.

Foi o julgamento do século. Durante quatro dias, advogados, defensores, promotores, procuradores, desembargadores discutiram a questão. Advogados da empresa insistiam que ela deveria comprovar sua prisão de ventre. Caso comprovada, os advogados disseram que ela deveria fazer o teste do iogurte, que com certeza ela seria curada.

Filósofos discutiam a questão da garantia do reembolso. Debatiam a questão da frase na propaganda. Chegaram a conclusão que a mensagem serve apenas para reforçar o instinto comprador do cliente. Mas, que, realmente seria impossível a comprovação. Depois de muito tempo, a justiça decidiu que Sônia deveria ser reembolsada com o valor do iogurte adquirido, R$ 11, com a correção monetária.

Por isso, às vezes é melhor arcar com o prejuízo. Ou, seguir o lendário exemplo da senhorinha abaixo.

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