O fim da maldição

Ou, como finalmente pagaram a lavadeira.

A história é conhecida e contada sempre que o nome do União de Rondonópolis é mencionado em matérias jornalísticas. O time foi fundado em 1973. Conseguiu um vice-campeonato em 1975 e foi tri campeão do Torneio Incentivo. Um torneio que tem um nome esquisito e que não devia valer muita coisa.

No ano de 1979 uma reviravolta na história da equipe. Havia uma lavadeira dentro do clube. Sua função era, adivinhem, lavar os uniformes dos jogadores. Seu salário atrasou um mês. Depois atrasou o segundo. Chegou até o quarto atraso seguido e ela foi à diretoria. Eles deram alguma desculpa trivial do tipo “estamos passando por um período de readequação da nossa folha salarial e em breve teremos um resultado positivo”.

Como é duro viver com quatro meses de salário atrasado, a lavadeira resolveu ir embora. Mas não foi embora calada. Ergueu os dedos e disse “Enquanto vocês não me pagarem, vocês jamais serão campeões de nada!”. Raios caíram do céu e uma risada maligna foi escutada ao fundo. Os dirigentes devem ter se arrepiado, mas não ligaram muito.

No ano seguinte, 1980, o União foi novamente vice-campeão. Algum dirigente deve ter dito “gente, é melhor pagar a mulher”. Desconfiados, eles foram procurar a lavadeira, para descobrir que ela havia morrido. Devem ter pensado “bem, a culpa não é minha”.

Seguiram-se vice-campeonatos em mais sete oportunidades (1984, 1991, 1995, 1997, 2001, 2004 e 2008). Houve ainda mais um vice na Copa Governador. Tudo ficou ainda pior quando o grande rival Vila Aurora conseguiu o inédito título matogrossense para a cidade.

Desesperados os dirigentes pensaram que era preciso acabar com a maldição da lavadeira. Levaram cheques até o túmulo. Mandaram dinheiro através de parentes mortos. Mas uma coisa resolveu o problema e o CH3 revela nesse momento. O responsável pelo título foi um homem: Pai Jorginho de Ogum.

Através de buscas na internet, os dirigentes do União conheceram a figura de Pai Jorginho, um babalorixá que já foi centroavante do Flamengo. Era o que eles queriam.

Terça-feira a tarde eu fui até a casa de Pai Jorginho. Cheguei lá e vi vários homens de terno na porta. Achei a cena estranha. Encontrei o Senhor das Almas em seu quarto, arrumando uma pequena trouxa com roupas que durariam no máximo dois dias. Ele havia deixado um bilhete para sua mulher. Uma vez que sua mulher é analfabeta, achei que o bilhete não teria muita função.

Pedi para que ele se acalmasse e ele me contou a história. Dirigentes do União de Rondonópolis foram o procurar para que ele incorporasse o espírito da lavadeira, para acertar as contas. Após comer algumas jujubas e alguns goles de caninha 21, ele estava incorporado. Ocorreu uma negociação tensa. A lavadeira exigia 10 mil reais. Os dirigentes acharam um valor exagerado. Cálculos sobre juros foram feitos. No final o acordo foi fechado em 8 mil reais.

Depois do valor ser pago na mão de Jorginho, que seria o responsável por fazer a entrega do valor, um dirigente avisou “É bom que o time seja campeão. Caso o contrário, você fará a entrega pessoalmente a ela”. O Mestre do Mistério suou frio, engoliu em seco e sentiu um frio no saco. Para garantir que ele não fosse sumir, foi levado junto.

Pai Jorginho assistiu ao jogo logo atrás do ex-governador Blairo Maggi. O União fez 3x0 no primeiro tempo. Podem pensar que ele respirou aliviado, mas não. Ele sabe que jogos do campeonato local são cheios de reviravoltas. Não estava nada garantido. E assim foi, o Operário conseguiu dois gols. Faltavam ainda 20 minutos para o fim do jogo e Jorginho já previa o pior.

Como suas previsões sempre dão errado, o Placar final foi de 3x2. Se Pedro Bial estivesse escrevendo esse texto, ele escreveria algo como “Usem protetor solar...” digo, “e todos dormiram felizes. O União, bravo União que conseguiu seu primeiro título. Dorme feliz também o pai-de-santo aliviado em se manter vivo. Aos derrotados, sobra a honra do jogo digno. E dorme finalmente em paz a lavadeira”. E foram todos felizes para sempre.

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