Retrospectiva 2021

“O grande temor, no fundo, é que daqui a alguns anos nos lembremos com alguma graça e saudade de 2020, quando o confrontarmos a 2021. O pior é que as chances de isso acontecer são enormes.
Adeus 2020 e tenha piedade 2021."

Foi dessa forma catastrófica, mas também premonitória, que eu terminei a retrospectiva sobre o ano de 2020. Após um ano inesquecivelmente terrível, havia uma desconfiança de que 2021 poderia ser ainda pior. Esse sentimento acabou sendo confirmado, como todos nós temíamos.

De certa forma, é possível dizer que 2021 foi uma continuação de 2020, um 2020 parte 2 e, assim como a maioria das continuações de filmes, o resultado foi catastrófico. 

No ano passado nós passamos por todo aquele turbilhão do lockdown, incerteza sobre o futuro da humanidade, pessoas tocando Bella Ciao nas janelas das suas casas, pilhas de pessoas morrendo solitárias em seus leitos de UTI, para o desespero de médicos e enfermeiros sobrecarregados.

Só que, de certa forma, nós éramos inocentes e acreditávamos que isso ia passar. Era uma das frases mais repetidas lá por abril e maio do ano passado. “Isso vai passar”. Não passou.

2021 chegou para mostrar que não há esperança, não há redenção. Vivemos tudo de novo e de maneira ainda mais brutal. Como se fosse um cão farejador, o presente ano encontrou todo e qualquer rastro de esperança em nosso organismo e, ao contrário do cão farejador, tratou de destruir tudo. Isso não vai passar, isso não vai acabar. A vida é um tormento.

Em 2021 vimos famílias lutando para encontrar um cilindro de oxigênio na vã esperança de manter um parente querido vivo. Pessoas morreram sufocadas. Pessoas dormiram na rua para ter a chance de ganhar ossinhos com resto de carne distribuídos por um açougue. A miséria ressurgiu com força.

O maior humorista do Brasil morreu de Covid-19, a cantora mais popular do Brasil morreu em um acidente aéreo. Uma dezena de atores, músicos. 2021 dizimou boa parte da alegria que o Brasil ainda teimava em ter, deixando apenas um sentimento amargo sobre a vida que deixou de existir.

É claro que em alguns momentos foi possível ter alguma esperança. Foi difícil não se emocionar com a primeira brasileira vacinada, mas a expectativa de que as vacinas fossem resolver se dissiparam a medida em que o Governo Federal sabotava sua aquisição e torcia explicitamente para a morte. Em vez de um direito, a vacinação começou a parecer um privilégio.



Tivemos uma segunda onda, uma terceira onda, talvez quarta onda e toda vez que as coisas parecem que podem se acalmar, surge uma nova variante em algum canto do mundo para nos lembrar que isso não vai passar.

Ninguém se lembra direito do que aconteceu em 2021, porque estamos há quase 20 meses vivendo a repetição de um filme ruim. O ano que termina entrará para a história como aqueles anos catastróficos da humanidade, como 1929. Tivemos os Jogos Olímpicos e durante quinze dias pudemos vier os sonhos de Rebeca, Rayssa, Kelvin, Isaquias e tantos outros, enquanto torcíamos para adolescentes sofrerem tombos de skate. Mas foram só 15 dias de um belo espetáculo executado diante de arquibancadas vazias.

A boa notícia, se é que é possível, é dificilmente 2022 será pior. Mesmo com as maiores tragédias que ainda podem nos assolar, o próximo ano não terá o amargor simbólico de representar o fim da esperança, porque ela já acabou.

Sobrevivamos a mais um ano, até 2022.

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