A Arte de Escolher um Hotel

Qual é o sentido da vida? Eis uma questão difícil de ser respondida. Ao longo dos últimos séculos, cientistas, filósofos, biólogos, sociólogos, antropólogos, antropomórficos e alcoólatras em geral têm tentado descobrir qual é a razão de tudo isso aí que nós chamamos de vida. Não há uma resposta unânime para o assunto e todo mundo pode ter a sua. A minha, é que nós vivemos para poder tirar férias.
Hotel Rústico, ambiente aconchegante, vizinhança agradável

Planejar as férias é uma atividade trabalhosa que requer horas de pesquisa. Geralmente, você não sabe nada sobre uma cidade quando pensa em viajar até ela. Não tem a menor ideia de onde ficam as atrações turísticas e os seus endereços não significam nada. A Avenida Getúlio Vargas de Porto Alegre é bem localizada? O centro de João Pessoa é legal ou é uma cracolândia?

Felizmente, a internet minimiza esses problemas. Ajuda inclusive na parte mais difícil do processo: escolher um hotel. Difícil e importante. Imagine ir para a Noruega e descobrir in loco que há uma convenção sobre o aquecimento global e que todos os leitos locais estão ocupados. Não sei como é que as pessoas conseguiam viajar antes da internet.

O Booking é o meu site favorito para pesquisar os hotéis. É possível ver a localização no mapa, cotar os preços e ainda ver uma grande quantidade de análises populares sobre os hotéis¹.

No meu método de pesquisa, eu determino a região em que quero ficar, vejo quais hotéis estão dentro do meu poder aquisitivo e então passo a ler os comentários. Isso ajuda a evitar que você fique em um hotel maravilhoso no meio de um campo minado, ou que seu hotel de frente pra praia sofra de uma crônica infestação de zumbis que comem os restos de comida acumulados ao longo dos últimos 10 anos.

Além de tudo, os comentários são sensacionais. Uma peça de humor involuntário. Normalmente eu opto por ler apenas os comentários negativos, porque eles podem trazer alguma verdade por trás das fotos profissionais. Os comentários positivos são extremamente bovinos, de pessoas passivamente deslumbradas que exageram nas exclamações.

Existem basicamente dois tipos de comentários negativos: 1) feitos por pessoas que reclamam por reclamar; 2) feitos por cavaleiros do apocalipse.
Decoração cafona. Demoraram seis minutos para me trazer um miojo!

Os cavaleiros do apocalipse são responsáveis por falas enormes no meio de vários comentários positivos e breves. Um relato destoante, que descreve um ambiente dominado por sujeira, baratas, ratos, privadas entupidas com merda até a tampa, esperma espalhada na mesa de cabeceira, frutas podres no café e funcionários psicopatas prontos para te esfaquear assim que você virar as costas. Essas pessoas presenciaram estupros nos corredores e um carregador de malas que espancou uma velhinha com o controle do ar-condicionado.

Já entre os comentários das pessoas que reclamam por reclamar, as questões mais normais são:
- Decoração do quarto: Eis o tipo de comentário mais inútil que pode ser feito. Pessoas reclamam que os quadros na parede não são de bom gosto e que os móveis de madeira são antiquados. Penso se a pessoa vai dormir no lugar ou se ele vai praticar algum distúrbio onanista relacionado ao mobiliário.
- Toalhas ásperas: Se repete em quase todos hotéis do mundo. Creio que exista uma seita de pessoas em busca da toalha perfeita que se frustram durante suas viagens.
- Café da manhã: Há de tudo. Desde quem reclame da qualidade, até quem reclame que no café tinha muito doce e ele não gosta de doce. Quem reclame que todo dia eram as mesmas coisas. Em um curioso caso de um hotel de Paraty, a pessoa dizia que a disposição dos alimentos era um pouco confusa. Eu fiquei nesse hotel e não entendi a confusão.
- Loucuras Diversas²: Em Buenos Aires, o recepcionista do hotel falava espanhol. A porta do banheiro encosta no vaso sanitário quando abre.

Há ainda a questão do preço pago. Quanto mais caro, mais propenso a hóspedes frescos e reclamadores³. Não que não haja lógica nisso. Se você procurar por hotéis no Rio de Janeiro, verá que um hostel no meio da favela é mais bem avaliado do que o lendário Copacabana Palace. Na página do hostel, sua perfeição é unânime. Na do CP, pessoas reclamam que o secador faz barulho, que a recepção demorou 15 minutos para entregar um prendedor de roupa e esse prendedor era de madeira, que o almoço no restaurante do hotel era caro (o cara paga mil reais no hotel e acha que o restaurante vai cobrar barato?).

Como é que as pessoas tiram férias depois da invenção da internet?

¹De forma alguma eu fui remunerado pelo Booking para fazer essa citação.
²A falta de critério também é um problema. Vi em um comentário, um cidadão reclamando que o chuveiro sofria muitas oscilações de temperatura e que ele acabou se queimando. Sua nota para o hotel era 9,2. Poxa, se eu me queimo tomando banho em um hotel, acho que eu daria nota 0 para ele.
³Deixando claro que o hotel em Paraty era um dos mais baratos da cidade. Motivo que torna o comentário sobre a disposição dos alimentos do café da manhã ainda mais interessante.

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