O pensador de memes

Poucas pessoas sabem, mas essas imagens “engraçadas” que poluem seu Facebook diariamente não surgem aleatoriamente. Elas são friamente pensadas por profissionais. O objetivo? O lucro. Para falar mais sobre o assunto, o CH3 entrevistou Anderson Pereira da Costa Arruda Plínio Marques Sampaio da Silva Bertozini*, um criador de memes. Natural de Cabo Frio-RJ, ele nos recebeu em seu iate na Costa do Sauípe para um breve papo sobre o assunto.

Muitas pessoas não sabem que sua profissão existe e tantas outras não entenderiam sua função. Como você define o seu trabalho?
Sei que minha profissão pode parecer um tanto quanto estranha para as pessoas. Confesso que eu mesmo acho estranho. Em parte por causa da palavra “meme”, que é uma palavra ridícula. Quando alguém me pergunta o que eu faço, digo que eu sou um consultor de mídias sociais, para parecer mais importante. Se minha avó me perguntar, digo que eu mexo com internet. Ela jamais entenderia.

Qual é a natureza do seu trabalho?
Bem, nós pensamos nos memes que irão aparecer na sua timeline do Facebook. Poucas pessoas percebem que há uma série de mensagens subliminares em cada desenho rabiscado com piadas inofensivas. Até porque, se percebessem, elas não seriam subliminares. Temos uma série de empresas que nos contratam para disseminar suas marcas nas redes sociais e é isso o que nós fazemos.

Como é que surgiu a oportunidade de entrar neste ramo?
Comecei algum tempo atrás, depois de postar umas piadinhas no Face. Fui procurado em casa por um cidadão misterioso que me perguntou se eu não queria ganhar dinheiro na internet. Antes que eu respondesse que pirâmide financeira era crime, ele me explicou como tudo funcionava, como era o sistema. Como eu não tinha nada pra fazer, acabei aceitando.

E o funcionamento da empresa?
Logo no meu primeiro dia de trabalho eu tomei um susto com a lista de multinacionais que contratam a nossa empresa. Fui apresentado aos meus colegas. “Aquele ali criou aquela série do cara que pergunta aonde você mora”, “esse outro foi o pioneiro na série de imagens sobre como eu me vejo”, “aquele ali foi o que resolveu que todas as frases do mundo seriam atribuídas a Clarice Lispector”. Enfim, temos várias cabeças.

Em um ambiente tão criativo, você teve alguma dificuldade?
Passei algum tempo batendo cabeça, criando pouca coisa, tendo muitas ideias rejeitadas. Até que eu tive a grande sacada da minha vida. Acompanhei pelo Twitter a polêmica sobre o filme “Ted”, aquele do ursinho, encabeçada por aquele político que foi policial e que tinha um nome engraçado, Patógenes ou algo assim. Pensei comigo mesmo que esse negócio podia render. No mesmo dia fui assistir ao filme e percebi que aquele ursinho fofinho era carismático, mesmo sendo malvado. Criei então a série do Ted Sincero.

A ideia foi aceita rapidamente?
Em um primeiro momento, meus superiores me questionaram pelo fato de que o personagem não falava nenhuma daquelas frases que eu criei. Até então, eles trabalhavam apenas com frases reais. Eu argumentei que aquilo era o futuro, que as pessoas queriam apenas um escape da realidade. E nada melhor do que um ursinho de pelúcia para falar algumas frases engraçadas. Foi um sucesso tremendo e aumentou a venda dos nossos clientes de maneira exponencial. Ganhei um aumento e em pouco tempo já existiam milhares de perfis baseados em fazer piadas com nossas fotos do Ted.

Você criou outros personagens?
Sim, era preciso uma sequência. Comecei a pensar e logo cheguei no Chapolin. Veja, a turma do Chaves faz um sucesso danado aqui no Brasil desde quando meu pai era criança. Mas os personagens eram meio batidos, todo mundo conhece as frases deles. O Chapolin é um pouco ofuscado, mas tem carisma também. O meu Chapolin sincero tem, sei lá, cinco bilhões de curtidas, um negócio surreal. Até comecei a bloquear as pessoas que compartilham Chapolin, porque eu não conseguia ver mais nada no Face.

Depois desse sucesso a sua reputação na empresa melhorou?
Virei diretor do departamento de memes com personagens e estabeleci o conceito de que o humor anda em uma tênue linha entre o realismo e a ficção. Uma frase tosca, mas como a maior parte dos meus colegas de trabalho são adolescentes retardados, eles ficaram impressionados e passaram a me tratar como um guru. Agora o nicho se expandiu. Temos frases com atrizes da malhação, artistas que já morreram. Nem sei mais quantos, meu departamento está tão grande que eu nem sei quem é que trabalha comigo. Só aprovo ou desaprovo. Realizei o sonho de virar burocrata antes dos 30.

O que esperar do futuro da sua profissão?
Nas reuniões que eu tenho com os outros diretores nós sempre estamos discutindo as tendências. Sabe como é, internet é uma putaria, daqui a um mês tudo mudou. Estamos apostando que o futuro, mais do que nunca, estará ligado ao humor com animais. Criaremos personalidades para cada um dos bichos existentes e espalharemos isso na internet, vendendo nossos produtos e perpetuando os aparelhos ideológicos.

*Nome fictício. Empresas de memes atuam secretamente e pedem sigilo total aos seus funcionários.

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