O Arremessador de Pratos

Dia desses eu estive freqüentando um popular restaurante especializado em comida de um país latino-americano. O ambiente era marcado pela apresentação de música ao vivo em espanhol, sempre as mesmas. Eu tenho a impressão que em toda a história não foram compostas mais do que vinte músicas em espanhol e o Gypsi Kings já cantou todas.

Pois então, em determinado momento, enquanto o público estava empolgado durante um desses clássicos castelhanos, um estrondo aconteceu no estabelecimento. Pessoas se assustaram, algumas correram para debaixo da mesa imaginando que um tiroteio havia começado. Mas não, era apenas um prato que havia caído no chão. Desses pratos bandeja, de metal, utilizados para servir bem os convidados.

Imaginei que havia sido um acidente. No cotidiano de um restaurante, acidentes como esses devem acontecer freqüentemente. O tempo todo esses pratos são levados de um lado para o outro. Mas eis, que pouco mais a frente, enquanto as pessoas cantavam parabéns para um aniversariante – aliás, este restaurante é famoso porque aniversariantes estão presentes em todas as mesas – outro prato caiu ao chão.

Percebi então que não era um acidente, havia uma pessoa, talvez um garçom, especializado em arremessar o prato de metal no chão durante os momentos de êxtase. Responsável por provocar o pavor na alma das pessoas. O prato ainda voltaria a cair no chão algumas outras vezes durante a noite, provavelmente durante a execução da Macarena.

Fui então conversar com este cidadão que arremessa pratos contra o chão. Fui saber um pouco sobre essa prática, suas técnicas, sua história de vida. Queria compreender como é que vivia uma figura assim.

Ele me contou que sua profissão não é fácil. Algumas pessoas se assustam quando o prato é arremessado ao chão e por isso ele já foi ameaçado de morte algumas vezes. Já precisou correr para dentro da cozinha para escapar da agressão dos familiares de um cardíaco que havia passado mal. Em outras vezes, ele precisa tomar cuidado para não transformar o ambiente em uma catarse coletiva. Certa vez, um grupo de gregos estava jantando no restaurante e ao escutar o barulho, eles se descontrolaram e começaram a quebrar pratos contra a parede.

Arremessar um prato também não é uma tarefa fácil. É preciso da técnica precisa para que o prato caía reto no chão e com força suficiente para fazer o barulho necessário. Um arremesso impreciso pode fazer com que o prato caía de lado e também pode estragar todo o momento. Para provocar uma queda perfeita, o garçom me disse que estudou na Rússia durante seis meses.
São anos até conseguir a excelência

Mas, além de tudo, há a questão do feeling. Ele me explicou que todo o trabalho não seria possível se ele não tivesse o dom. “Foi algo que nasceu comigo, eu não sei explicar. Acho que é algo divino”. É preciso saber o momento exato de arremessar o prato, para que tudo funcione perfeitamente. “Leva pelo menos dez anos para formar um atirador de pratos excepcional. Os melhores currículos são disputados no mercado e podem ganhar até R$ 20 mil por mês”.

Em dezembro, os atiradores de prato mundo se encontrarão em Tegucigalpa para o segundo congresso mundial da categoria. O principal objetivo da categoria é juntar forças para incluir o arremesso de pratos no cronograma olímpico a partir de 2020. O garçom com quem conversei diz que esta é uma reivindicação antiga da categoria. Enquanto ela não se concretiza, ele diz que segue trabalhando.

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