Parabéns para você: uma análise histórica

Durante boa parte de sua existência neste planeta, a humanidade conviveu com a dificuldade de saber quando alguém fazia aniversário. Lembrar-se de todas as datas de aniversário dos seus principais amigos e parentes era uma atitude ninja. Você teria que ter acesso à informação privilegiada, ou teria que fazer a pergunta pessoalmente e depois anotar a resposta em um bloquinho. Convenhamos que não é muito normal chegar em alguém e falar “e ai, nasceu quando?”.

Quando alguém se lembrava do seu aniversário e lhe parabenizava espontaneamente, era uma verdadeira prova de amizade. Quando a lembrança era recíproca, podemos dizer que estaríamos diante de um pacto de sangue. Mas, aos poucos isso mudou. Se em tempos remotos, as pessoas mal sabiam a data em que haviam nascido, com o advento do Orkut, parabenizar alguém se transformou no mais banais dos atos. Mais banal do que manter relações sexuais, consentidas ou não, no Big Brother.

Aniversário no Orkut
Aqui, vale lembrar que o Orkut era uma rede social baseada no tripé: data de aniversário, depoimentos emotivos e crises de relacionamento provocadas por scraps sacanas, fruto da falta de informação de algumas pessoas que acreditavam que os recados só podiam ser lidos pelo dono da conta. Sim, as datas de aniversário ocupavam o lugar de destaque da finada rede, era a primeira coisa que você via tão logo preenchia os campos de acesso e dava enter.

Assim sendo, quando o seu aniversário chegava, você recebia uma enxurrada de felicitações. Sua mãe, sua namorada, seu melhor amigo, seu colega de faculdade, aquele cara que estudou com você na oitava série, aquela menina da outra turma com quem você nunca havia falado, a ex-namorada do seu primo, aquele cara que, por céus, você tenta mas não consegue se lembrar de onde é que conhece ele, enfim, todos lhe desejavam os mais sinceros e profundos parabéns. Que você realize todos os seus sonhos, que você seja muito feliz hoje e sempre porque você é especial e você merece cara. Sim, você merece porra.

O aniversário deixava, então, de ser um evento no qual você convidava as pessoas e torcia para que elas comparecessem em um número suficiente para aparecer na fotografia. O aniversário passava a ser um evento em que as pessoas se autoconvidavam, insistiam para que você fizesse algo. Ficávamos todos extremamente envaidecidos e nos sentíamos importantes.

Então, o Orkut morreu e o Facebook surgiu de suas cinzas, tomando para si uma herança maldita de mensagens motivacionais. No entanto, na Era do Facebook, os aniversários perderam a importância outrora adquirida.

Piquenique com os amigos
Talvez porque o Facebook não dê o destaque necessário para o aniversário de seus usuários. A notificação aparece discretamente em um canto de página, ao lado das solicitações para usar algum aplicativo inútil. Muito mais importante, é mostrar que quinze amigos seus já curtiram o Luciano Huck e suas palavras de sabedoria universal.

Também é possível que o abuso do Orkut tenha provocado uma banalização das congratulações aniversariantes. De tanto receber parabéns esvaziados as pessoas adquiriram uma passividade diante do aniversário alheio. “Aniversário do Marquinhos? Foda-se. Hoje é ele e amanhã é outro. Ano que vem tem de novo. Azar dele que está ficando mais velho, maldito”.

O fato é que nos tempos atuais, os aniversários estão sendo cada vez menos parabenizados. Observo aniversariantes de todas as idades, todas as cores, todas as classes sociais, orientações sexuais e pedagógicas. Vejo que todos sofrem hoje com mirradas congratulações. Prevejo um futuro de baixa-estima para o nosso povo, o que pode acarretar em uma redução dura e literal do número de aniversariantes.

Comentários

Anônimo disse…
O Cão Leproso certamente está feliz com esse declínio do número de aniversariantes.
Anônimo disse…
Adoro a forma descontraída e irreverente como são tratadas os acontecimentos, a realidade humana ou desumana.