Palestras

Ao longo dos séculos, as palestras têm ocupado um lugar importante no imaginário do homem médio. As palestras são identificadas como uma oportunidade única, na qual um ser humano de enorme conhecimento irá, humildemente, dividir esse conhecimento com outras pessoas. Ele falará sobre importantes descobertas que fez, o que ele aprendeu durante sua vida. Irá ajudar seus espectadores a superar problemas e irá também agregar conhecimento.

Mas, com o tempo, as palestras começaram a se transformar num evento midiático. Não sei se o culpado é Bill Clinton, Bill Gates ou Pedro Nadaf. Mas existe em nossa sociedade atual a profissão de palestrante. Uma pessoa conhecida, que venceu na vida e que vive por aí dando palestras, motivacionais ou não.

Veja o caso de Bill Clinton. Ele dá mais de 200 palestras por ano e em cada uma, ele ganha mais do que ganhou nos oito anos em que foi presidente dos Estados Unidos. Bill Clinton pode ter sido um político interessante, pode ter feito grandes feitos administrativos, mas, o que será que sua palestra tem de tão interessante?

É claro que ainda existem as palestras de cunho acadêmico. Geralmente proferidas por professores doutores em algum auditório de alguma universidade. Seu público consiste de alunos que estão ali porque assim escapam da aula e alguns outros poucos interessados, fora os famosos loucos de palestra.

Mas vejam o caso do Bernardinho. Um técnico vitorioso, um cara capaz de fazer com que uma alcatéia de lobos (um antigo professor meu de auto-escola diria “uma multidão de lobos”) se transforme em um time vencedor de voleibol. Ele dá dezenas de palestras enquanto não está treinado algum time. Sobre o que ele fala? Sobre a busca pela perfeição, o não desistir nunca. Ele pode falar o quanto ele quiser, mas não adianta. Você jamais será um Bernardinho.

Passo em frente a um stand e vejo o anúncio de um evento com palestrantes famosos. A fama hoje é mais importante do que o conteúdo do cidadão. O maior escritor búlgaro da história dará uma palestra para meia dúzia de perdidos. Enquanto que um membro do CQC reunirá meia cidade em um anfiteatro lotado. Nem que seja para que ele fique uma hora contando estórias de sua vida.

E aí há o fato de que – não é porque o cara é famoso que ele é bom. E não é por ser um gênio da humanidade que ele será um bom palestrante. O cara pode não ter o dom da oratória, pode não saber explicar todo o seu conhecimento. Ou pode ser um chato danado.

E o que acontece então? Palestras são recheadas de clichês motivacionais. Não desista nunca. É preciso lutar por seus sonhos. Só cheguei aqui graças ao meu esforço. Esteja sempre atualizado. E outras mensagens vendidas como verdades absolutas, que você encontra na bancada de best-sellers de qualquer livraria fajuta.

Há ainda outro fato preocupante, que é a standupização da sociedade atual. Qualquer pessoa que fale para um outro grupo maior de pessoas, tem a obrigação de ser engraçada. O mesmo acontece em uma palestra.

Faça o teste. Vá ao fim de alguma palestra qualquer e meça os comentários. As pessoas que dizem que a palestra foi muuuuuuito boa tendem a se lembrar de todas as piadas que o palestrante fez, fora um ou outro clichê motivacional. Não importa se o assunto era a fome na África ou a AIDS entre monges albinos. Se o palestrante manter um tom sério, todos o considerarão um chato. Se ele for uma piadista, a palestra terá sido um sucesso.

Não perca em breve a palestra motivacional do Cão Leproso.

Anexo 1: Exemplo de fala chata de palestra.
- A fome na África é preocupante. Um problema sério que envolve todos os governos do mundo que não podem mais negligenciar a morte de 1 milhão de pessoas por ano.

Anexo 2: Exemplo de fala legal da palestra.
- Não podemos desistir nunca, porque vocês sabem, você ai bonitão de camisa vermelha, que o Globo Esporte só passa depois do almoço. O Globo Esporte tem que passar na África também.

Comentários

Thiago disse…
Eu tenho um princípio de vida que é nunca ir a palestras, seja de quem for. Ainda mais agora que loucos entram em escolas falando em palestras e começam a atirar.