Idiotice Genial

Eu estava no Terceiro Ano do Segundo Grau. A aula era de português e a professora falava sobre sofismas, falácias e outras coisas. A sala estava dividida em grupos de seis alunos que deviam elaborar perguntas relacionadas ao tema. Pela média, cada aluno deveria criar dois exercícios. Vi alunos se matando em livros para corresponder as expectativas criadas pela professora.

Eu enrolei para fazer o que devia e quase no final, improvisei com a seguinte questão:
“- Todos os vegetais são imóveis.
- Todas as pedras são imóveis.
- Então, todas as pedras são vegetais.
Explique porque o raciocínio está equivocado”.

Era uma questão claramente idiota. Entreguei-a ao meu grupo que riu de mim. Concordaram em incluí-la apenas para fazer número. Sentia um misto de vergonha, alívio e medo de que, ao ler minha questão, a professora se sentisse enfurecida, ofendida e me obrigasse a comer o papel como punição.

Mas, eis que na aula seguinte a professora começou a falar das questões para que a sala respondesse. E então, ela fez uma introdução “Agora, essa questão eu achei genial, muito bem elaborada”. E para o meu espanto, era essa minha questão. Uma questão aparentemente e obviamente idiota, mas que amoleceu o coração da professora que viu nela... não sei o que ela viu. Alguma sutileza que fazia essa idiotice genial.

Começou então um debate na sala. Qual seria a resposta correta. Claro, eu não poderia dar a resposta. Alunos enfurecidos em não conseguir responder. Eles tentavam dizer “oras, não tá certo porque isso é idiota!”. Após o começo de um breve apocalipse civil eu fui dar a resposta. Que claro era idiota.

O que estava errado na formulação do exemplo era a ordem dos elementos, que alteravam o produto. Geralmente diz-se que todos os cachorros são mamíferos. E que todos os mamíferos são seres vivos. Logo, todos os cachorros são seres vivos. Para que o pensamento pudesse ter uma linha correta, teria que dizer que todos os vegetais são imóveis e que todas as coisas imóveis são alguma coisa. Como todos os sofismas são idiotas.

Há uma breve linha que separa os idiotas dos gênios. Uma série de fatores que os distinguem. Um fato pode ser idiota ou genial, dependendo do lugar, da época em que acontece. Ou da pessoa que fala. Se você inventar uma palavra agora, será um retardado. Se for Guimarães Rosa, é um imortal da academia de letras. Se você faz uma piada de churrasco é um idiota. Se for um membro do CQC é um gênio.

O humor nonsense e o surrealismo de uma maneira geral, é um exemplo. Piadas nonsenses envolvem situações idiotas, retardadas, débeis. Mas justamente por isso se tornam geniais. A graça está justamente nesse inusitado, tão retardado que te mata de rir.

Pinte um quadro em que gavetas saem do corpo da pessoa. Você é um retardado, exceto se você for Salvador Dali. Para jogar tinta no quadro e espalhar como se fosse uma criança, trate de ser um pintor famoso e dadaísta. Um artista plástico famoso para que um extintor de incêndio, um quarto vazio, um barco pintado de branco se transformem em arte.

Termino esse post com uma poesia minha. Feita quando eu tinha quatorze anos e tentava por em prática a arte de fazer poesias em cinqüenta minutos para a aula de português. Entreguei-a meio constrangido, com medo de que o professor achasse que eu estava de sacanagem. Poucos meses depois, ela estava publicada no jornal do colégio, ao lado de diversos poemas em ordem indireta escritos, para rimas criar. Devem ter me achado um Drummond, amargo, resignado com a vida.

Há quinze anos atrás, eu não havia nascido
Há dez anos, era dez anos mais novo
Há cinco anos atrás, tinha cinco anos a menos que hoje
E hoje sou cinco anos mais velho em relação a cinco anos passados
E daqui a dez anos serei dez anos mais velho
E daqui a cem anos, provavelmente terei morrido.


Vamos lá, vocês também devem ter seus momentos idiotas, que foram considerados geniais.

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