A arte de falar no telefone

Há uma certa polêmica sobre a invenção do telefone. Passamos nossas vidas inteiras aprendendo que o pai do aparelho foi Graham Bell, um escocês que vivia no Canadá. Mas, recentemente, o Congresso Americano resolveu que o inventor foi Antonio Meucci, um italiano que vivia nos Estados Unidos. Claro, os americanos são muito corporativistas nestes momentos. Para eles, a feijoada só poderia ter sido inventada por um escravo americano.

Como o momento da invenção do telefone não foi filmado, é difícil saber qual é a verdade. Em todo caso, este blog aposta que o telefone foi inventado por Max Gehringer.

O telefone também está envolto em outra polêmica: Ok, inventaram o primeiro telefone. O telefone serve para fazer ligações. Se não existia outro telefone, do que adiantou a invenção do primeiro? Mais importante foi a invenção do segundo telefone, e dos cabos de transmissão. Diz a lenda que a primeira ligação foi feita para Dom Pedro II. Seria muito melhor ter dado um telefone de presente para uma pizzaria da região e assim, ter inventado o primeiro disk Pizza, com uma magnífica exclusividade.

O escritor argentino, nascido na Bélgica, Júlio Cortazar dizia sobre o relógio “Quando dão a você de presente um relógio, estão dando um pequeno inferno enfeitado. Eles não dão de presente apenas este miúdo quebra-pedras. Dão a necessidade de dar-lhe corda todos os dias, a obsessão de olhar a hora certa nas vitrines, dão o medo de que seja roubado”.

Por outras razões, o telefone também é um pequeno inferno particular. A partir do momento em que você tem um telefone, você dá as pessoas o direito de te ligarem. Seja para conversar, te dar uma notícia, pedir uma informação, oferecer um produto ou pedir a sua opinião sobre o deputado Domingos Sávio. A qualquer hora do dia. Não existem leis que proíbam que você seja telefonado de madrugada.

E você tem a obrigação de atender. Não importa se você estiver tomando banho, dormindo ou almoçando. As pessoas te questionarão com voz de juízo “porque você não atendeu”. Você terá que arrumar uma maneira de solucionar o problema. Secretárias eletrônicas, direcionamento de ligações. Mesmo assim, as pessoas nunca acreditarão que você não atendeu porque não dava. O não atendimento de um telefone é sempre interpretado como um ato maquiavélico, friamente pensado. Temos identificadores de chamada para saber se conhecemos ou não o número que nos liga, mas atendemos do mesmo jeito.

Com o celular, a coisa é pior ainda. Você está disponível o tempo todo em qualquer lugar do mundo. Pode ser facilmente localizado e monitorado. Creio que muitas pessoas seriam favoráveis a pena de morte para aqueles que não atendem o celular “pra que você tem um celular, se não atende¹” dizem.

E há ainda o lado mais estranho. Para muitas pessoas é normal, mas para mim não é. Falar no telefone. Ele foi inventado para isso, eu sei, mas é estranho. Você, em algum lugar do planeta conversa com outra pessoa que pode estar em qualquer outro lugar através de uma caixinha. Você não pode perceber a postura corporal da pessoa, o ambiente em que ela está, para ver o que ela pensa. Mesmo assim, tem que dar respostas rápidas. Não é a toa que os trotes são feitos por telefone.

Por anos, eu não conseguia falar ao telefone e tinha pavor deste momento. O toque do aparelho era algo assustador e ter que telefonar para alguém era uma tortura. Meu coração batia forte e eu suava frio nesses momentos. A cada toque, eu pensava em desistir. Meu medo acabou por assustar outras pessoas. Vinícius até hoje chora ao se lembrar de uma conversa comigo. Várias pessoas são receosas em me ligar.

Mas hoje as coisas mudaram. Atendo o telefone normalmente e consigo ligar para uma pessoa desconhecida, depois de respirar fundo. As pessoas não têm mais desejos suicidas quando falam comigo. Sou um homem recuperado. Agradeço essa recuperação a minha namorada. Obrigado.

¹ Curioso notar que uma única e mísera vez em que o celular não é atendido, é suficiente para que este fato seja tratado como um procedimento padrão de sua persona.

Comentários

Adérito Schneider disse…
O mais engraçado do celular é o ar inquisidor de quem te liga. "Onde você está?" é a primeira frase depois do "Oi! Tudo bem?".
Ah, Ana Rosa, muito obrigada! Eu também era das pessoas que tinham medo de telefonar pro Guilherme. E eu também nunca fui muito afeita a falar por telefone e minha mãe sempre diz a nota de rodapé pra mim. Porque eu esqueço que tenho um celular, ele serve mais como um despertador mesmo.
Ana Rosa disse…
De nada!
Para mim nunca foi um problema falar ao telefone. Lembro da época da escola, via minhas amigas todos os dias, chegava em casa e conseguia conversar mais uma hora ao telefone com elas. Meu pai reclamava... a conta do telefone de casa sempre vinha alta.
Anônimo disse…
nao atender o telefone celular me ter brigas ferrenhas com minha namorada, na epoca. ate hj ela ainda espiona meu celular em busca de algo comprometedor, algo que nao ira ocorrer.
ps: por causa dela ganhei 2 aparelhos em menos de um ano, rsrsrsrsr